A armadilha do amor próprio

por Fernanda Vilarrodona

Em tempos em que a ideia do amor próprio é exaltada, fica a dúvida: será que somos realmente suficientes para nós mesmas? Não me levem a mal, há algo muito lindo, poderoso e importante no exercício de cultivar o autoamor. Afinal, como podemos realmente transbordar algo para o outro que não existe dentro de nós?

Aprender a ser uma ótima companhia para si mesma é, sem dúvida, um passo extremamente relevante para o seu autocuidado e até para a construção de relacionamentos saudáveis. Mas será que para por aí? Será que conseguimos realmente ser independentes de tudo e todos, preenchendo-nos com o amor que vem apenas de nós?

A resposta é: não (ufa). Se você algum dia se sentiu frustrada por não conseguir se conectar com frases de empoderamento no Instagram, fique tranquila, não há nada de errado com você. Há algo intrínseco no ser humano que busca por conexão e pertencimento. Precisamos do amor do outro para nos sentirmos parte de algo. O problema é quando direcionamos essa busca para uma única pessoa e passamos a depender da sua constante prova de afeto para nos sentirmos amadas.

Pessoa sentada em um café, vestindo suéter preto de mangas longas, segurando uma xícara de café com uma das mãos e lendo um livro com a outra.
Foto: Jade (Reprodução/Pinterest)


Achar que a única fonte de amor verdadeiro vem através do amor romântico dos contos de fadas é simplesmente um desperdício. É como se, entre toda a gama de flores que a natureza nos oferece, conseguíssemos enxergar beleza apenas nas rosas vermelhas e em nada mais. Porém, como uma boa romântica que sou, entendo perfeitamente que existem coisas que só o amor a dois consegue nos proporcionar. A busca por conexão e a construção de sonhos de vida ao lado daquela pessoa especial é tudo de bom, mas não pode parar por aí.

Amar não é uma tarefa fácil, e por isso, racionalizar esse sentimento e tentar transformá-lo em um passo a passo para o sucesso é absolutamente frustrante. Claro, existem armadilhas das quais podemos nos precaver, mas deixa eu já te contar uma coisinha para evitarmos ilusões: inevitavelmente, em algum momento, você vai sofrer por amor (ufa de novo). Assim como alegria e tristeza andam de mãos dadas, amor e sofrimento também. Que bom que estamos suscetíveis a sofrer, isso quer dizer que estamos abertas ao amor nos atravessar. Vale ressaltar que aqui estamos falando da dor inevitável da perda, frustração ou desilusão, e não de abusos ou crimes.

Mas afinal, é possível ser feliz sozinha? Sim e não – uma resposta tão dual quanto a própria filosofia do amor. Um dos principais pilares da felicidade sempre será as nossas relações e o cultivo dessa emoção tão poderosa que tentamos arduamente decifrar. Porém, para o amor existir, ele precisa não só de conexão, presença, toque e troca, mas também de espaço. Tente visualizar: são necessários dois pilares para sustentar uma superfície, mas, se eles estiverem absolutamente grudados, não existe estabilidade ou equilíbrio – é necessário espaço entre eles.

E é justamente nesse espaço necessário entre o "eu e o outro" que a nossa companhia deve ser a melhor possível. Então, cultive sim momentos de solitude: leve-se para passear, aprenda a cuidar de si mesma e seja seu porto seguro – mas não jogue sua âncora forte demais e pare de navegar. Existe um oceano infinito de trocas, descobertas, aventuras e relações à sua espera.

O amor pode até ser esse mar de emoções, ora revolto, ora calmo, que nos leva a altos e baixos dos mais complexos e desafiadores que podemos enfrentar, mas é justamente nessas águas profundas e desconhecidas que encontramos o verdadeiro sentido da vida.

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