Maternidade na moda: como a indústria fecha os olhos para as mães

por Giulia Coronato

Essa semana, vi um post no Instagram que falava sobre como a maternidade na moda era a "tendência" do momento. No primeiro momento que me deparei com o título da postagem, achei legal e divertida, mas, depois que consumi o conteúdo presente no carrossel, fiquei com um nó na garganta, sentimentos confusos e tirei alguns minutos para refletir sobre aquilo. Apesar de ter entendido o objetivo da publicação, que era celebrar o fato de mães estarem finalmente sendo representadas e vistas na indústria da moda, me senti injustiçada e não pude deixar de pensar o quão superficial era isso, já que no meu ponto de vista a moda odeia as mães

Eu sei, eu sei, minha constatação pode ser um pouco dramática e cheia de hipérboles, mas calma que vou me explicar. Eu acho muito incrível termos a maternidade representada na moda, até porque sou mãe e trabalho na indústria, mas vocês conseguem entender o quão raso é isso dentro do cenário atual? Os exemplos citados no post do Portal das Modas eram principalmente dois: um que se tratava de um colar escrito “mum” (uma forma carinhosa de falar “mãe”, em inglês) vendido pela marca da Phoebe Philo, no valor de aproximadamente R$20.000, e outro, que pontuava o momento mais viralizado da última temporada de fashion weeks, com o filho da estilista Chemena Kamali invadindo a passarela após o primeiro desfile da mãe para a Chloé. Sim, eu acho tudo isso emocionante e vitorioso, mas o que eu não pude parar de pensar, depois que li a frase “ser mãe está na moda”, é que a moda passou décadas virando o rosto para a maternidade, e agora quer lucrar em cima disso? 

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Foto: Giulia Coronato (Reprodução/Instagram)


A prova viva de que a moda odeia as mães é que é praticamente impossível encontrar roupas estilosas e com informação de moda e tendência para gestantes, ou puérperas, ou lactantes. Não conheço uma mulher que tenha engravidado e não tenha sofrido com isso, a perda de identidade dentro daquelas roupas que não possuem nada de si, são só um pedaço de tecido usado unicamente pelo quesito funcional. 

Comigo foi assim! Eu nunca gostei de vestidos de malha ou comprimento midi, mas durante minha gestação me vi obrigada a usar essas peças, porque simplesmente não encontrava calças, saias, shorts ou outros itens que me serviam e possuíam meu estilo. E foi igual enquanto amamentava, todas as blusas que eu tinha no armário impossibilitavam a amamentação da minha filha e eu tive que passar meses usando somente sutiã de amamentação. 

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Foto: Chemena Kamali (Reprodução/Harper Baazar)

Além do tópico das roupas, ainda tem o fato da indústria da moda não ajudar na luta por direitos para mães e seus bebês. O mundo da moda não aceita interrupções, ou desacelerações, algo que toda mãe precisa. A licença maternidade no Brasil é de 4 ou 6 meses, mas, a amamentação obrigatória - segundo a OMS - deve seguir até no mínimo os dois anos da criança., Ttá vendo como a conta não fecha? Se “ser mãe está na moda”, a indústria deveria aproveitar a ascendência dessa “tendência” para lutar por leis trabalhistas melhores ou uma melhor rede de apoio do governo. 

Segundo um levantamento da Linx, especialista em tecnologia para o varejo, as compras realizadas por mulheres em 2022 representaram 80% do total de transações, ou seja, como pode uma indústria que depende de mulheres para sobreviver, fechar os olhos para a maternidade? 

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Foto: Marine Serra (Reprodução/Vogue Runway)

Nós, mães, vamos continuar aqui, por nós e por nossos filhos, ao mesmo tempo que continuamos lutando pelo simples direito de ter uma roupa que nos sirva, ou que nos permita alimentar a nossa cria. Enquanto isso, celebramos sim as vitórias, mas sem esquecer que estamos longe, muito longe, de estar na moda. 

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