O que é upcycling na moda e quais marcas se destacam nesse meio

por Aline Santos

Você provavelmente já ouviu falar sobre, mas talvez ainda se pergunte: o que é upcycling? Hoje respondemos a essa pergunta com uma investigação sobre o assunto, cada vez mais em pauta na indústria da moda. Afinal, para um futuro sustentável de consumo é preciso que haja uma desaceleração das produções em grande escala, assim como uma mudança em prol do melhor uso de materiais já existentes, o que nos leva a essa tendência que busca o fim do desperdício. 

Para trazer todas as informações necessárias, começamos com uma explicação sobre o que é upcycling. Em seguida, batemos um papo com a expert em tendências da WGSN, Mariana Santiloni, a fim de descobrir qual o futuro desse movimento que une sustentabilidade e moda, e também convidamos a designer Juju Lattuca para nos contar um pouco sobre a sua trajetória e relação com o upcycling.

E se engana quem pensa que essa tendência vai demorar para chegar por aqui. Algumas marcas pequenas brasileiras já estão apostando todas as fichas em coleções focadas na reutilização de tecidos! Para saber mais, continue com a gente abaixo:

_ o que é upcycling?

Mas afinal, o que é upcyclingO upcycling nada mais é do que uma técnica de reaproveitamento de materiais já existentes, transformando peças que seriam descartadas em aterros sanitários e dando um novo sentido para elas. Em outras palavras, usar as sobras para criar algo novo. Essa tendência surgiu na década de 90, porém só agora estamos de fato olhando com mais atenção. Um dos motivos é porque estamos cada vez mais em busca de alternativas sustentáveis para o consumo do futuro.

E por falar em alternativas sustentáveis, vale mencionar que o upcycling é uma solução inteligente e lucrativa para marcas e consumidores, pois o que era desperdício se torna um novo item vendável. Além disso, alimenta a criatividade e resulta em roupas exclusivas. Também estão diretamente ligadas ao upcycling, a técnica de patchwork, que trabalha com emendas de retalhos de diferentes tecidos, e o rework, que, assim como o próprio nome diz, é uma forma de retrabalhar uma determinada peça por meio de customização.

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Foto: Vivienne Westwood (Reprodução)


_ upcycling na moda

De acordo com uma matéria do site BOF (Business Of Fashion) e o levantamento da instituição Ellen MacArthur Foundation, anualmente a indústria global da moda produz cerca de 53 milhões de toneladas de fibras têxteis e 70% acaba em aterros sanitários. Já no Brasil, segundo um relatório do Fashion Revolution de 2020, por ano são produzidas 1.100.000 toneladas de roupas, sendo 12% de desperdícios.

No mundo inteiro, diversas marcas jovens já estão caminhando para um trabalho mais sustentável e manual com peças feitas a partir do reaproveitamento. Porém, algumas outras já renomadas no mercado da moda, também estão abrindo o olhar para essa tendência, um exemplo mais recente é a britânica Vivienne Westwood, que apesar de já ser conhecida por levantar diversas causas ambientais por meio de sua marca, apresentou na última semana uma coleção feita com 90% de materiais com menos impacto no meio-ambiente e jeans reciclados.

Em 2019, a marca Patagonia produziu cerca de 10 mil peças de roupas feitas a partir de materiais reciclados e de roupas já existentes no acervo. Entre as marcas de luxo, a Burberry anunciou no final do ano passado o seu mais novo programa chamado "ReBurberry Fabric", onde em parceria com o British Fashion Council, irá doar as sobras de tecidos para estudantes de moda carentes.

_ o futuro sustentável por wgsn

Para entender melhor o que é upcycling nos tempos de hoje e como será no futuro, entrevistamos a especialista em tendências da WGSN, Mariana Santiloni. Do impacto econômico ao consumidor final, a expert também nos contou como a pandemia acelerou essa tendência.

1. quando surgiu o upcycling? a pandemia acelerou a sua difusão?

M.S.: Em 2016, nós, da WGSN, previmos que as pessoas comprariam pensando além do propósito de adquirir um item novo. Com a pandemia, aumentou a ansiedade financeira que, por sua vez, está acelerando este movimento de consumo consciente à medida que os consumidores estão agora pensando não apenas no valor monetário como também na longevidade do que compram.

2. e como vocês entendem a relação do upcycling com a moda nos próximos anos?

M.S.: Hoje, segundo a ONU, a indústria da moda é responsável por mais emissão de carbono do que o transporte aéreo e marítimo juntos. Somado a isso, há a escassez de recursos, que afeta tanto as práticas quanto os produtos, e o upcycling, isto é, a tradição de reparar e reutilizar se torna naturalmente parte do estilo de vida dos consumidores.

Do lado das marcas, existe o desafio de caminhar além do marketing para não cair no greenwashing. É preciso cada vez mais pensar em reduzir o desperdício, facilitar a reciclagem, reparar, reutilizar e reaproveitar. Para a moda, priorizar o ciclo de vida do produto é o futuro. Aqui no Brasil já se tem marcas de upcycling como a Ventana, que trabalha resgatando peças e reutilizando sobras de tecidos.

3. como essa tendência impacta na economia?

M.S.: Embora o conceito de valor esteja tradicionalmente centrado no custo de um produto, o significado a partir de agora passa a ser "se vale a pena”. Portanto, os produtos capazes de manter as pessoas saudáveis e seguras terão um valor maior e atrairão mais o público, mesmo quem foi ou é financeiramente impactado. Veremos cada vez mais novos tipos de negócios focados em upcycling, slow fashion, locação e revenda, pois essas estratégias também permitem aos varejistas ter uma nova fonte de receita e desenvolver uma relação de fidelidade com o público.

4. é possível dizer que o consumidor do futuro vai preferir comprar em marcas mais sustentáveis, de upcycling ou não? por quê?

M.S.: Os consumidores estão economizando mais e gastando menos porque têm receio do futuro. E estão avaliando o tipo de produto que compram e como compram, pensando no custo-benefício em vários níveis. Sem dúvida, as prioridades estão mudando e com isso, a qualidade e os níveis de consumo são fatores cada vez mais problemáticos. Surgem perguntas que reavaliam a forma de comprar: o produto vai durar? É sustentável? É único? Como eu me sinto em relação a ele?

Além disso, considerando que cerca de 30% de todas as roupas produzidas no mundo nunca são vendidas, a filosofia do "compre menos e melhor" vem silenciosamente ganhando força como uma resposta ao fast fashion. Aliás, comprar menos e melhor é uma tendência que prevíamos na WGSN quando falamos sobre "o fim do excesso", onde a quantidade dá lugar a uma melhor qualidade, melhor funcionalidade e melhor design.

_ criando coleções com juju lattuca

Juju Lattuca chama atenção à primeira vista no Instagram. Sua criatividade grita através dos posts na rede social. Formada em design, hoje ela atua com planejamento criativo de marca e no desenvolvimento de produtos. "Minha relação com upcycling vem de muitos anos. Eu sempre curti reutilizar e ressignificar objetos", relembra, "meu primeiro projeto foi desenvolver adereços ressignificando materiais diversos (fósforos, parafusos, entre outros itens) para uma personagem de uma novela da Globo."

Desde então, não parou. "Comecei a tentar conectar o upcycling de uma maneira mais responsável quando me dei conta dos estoques parados que as marcas tinham", diz, "Acho que todo mundo (ou, pelo menos, é o que eu espero!) tem esse estalo alguma hora."

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Foto: Juju Lattuca por Kenny Hsu (Reprodução/Instagram)

Os meus projetos seguem duas linhas: uma de ressignificar objetos (que nem sempre tem uma pegada sustentável) e outra de reutilizar materiais diversos, com propósito de gerar um impacto sustentável maior.

Abaixo, reunimos alguns dos trabalhos mais icônicos da Juju para você conhecer e ver o upcycling na prática. A designer já criou uma coleção a partir do plástico bolha, que virou capa de chuva para a Plástico Bolha Store (Booolhas). Também esteve à frente de uma colaboração com a Farm, onde iscas de pesca se tornaram brincos charmosos, e com a Zerezes, criando uma coleção de óculos feita a partir da reciclagem de canudinhos plásticos.

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Foto: Colaborações Juju Lattuca (Reprodução)

Em outra ocasião, Juju transformou plástico descartado em botões de camisa para a Bapho Brasil, e também desenvolveu bucket hats a partir de sacos de feira para a marca infantil, Fábula.  "Meu processo criativo sempre tem como propósito trabalhar com coisas que nem sempre damos tanto valor ou atenção", explica, "meu maior desafio é entrar em várias marcas e instigar esse movimento: olhar pro simples e transformar em algo de desejo."

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Foto: Colaborações Juju Lattuca (Reprodução)

Sua mais recente colab foi com a marca carioca Sri Clothing. Nesse caso, Juju usou sobras de tecidos para desenvolver uma coleção incrível e brilhante, no sentido literal da palavra, pois as peças vêm carregadas de paetês. "Nessa última coleção, basicamente usamos retalhos de coleções antigas, ou seja, que todo mundo já tinha visto", conta, "e também trabalhamos com alguns retalhos de estampas que ainda a marca vai lançar. A partir disso, fizemos a técnica de patchwork e o resultado ficou super interessante. O retorno foi mega positivo!"

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Foto: Juju Lattuca para Sri Clothing (Reprodução/Instagram)

_ marcas focadas em upcycling

A Ventana é referência quando você busca saber mais sobre o que é upcycling no Brasil. De Santa Catarina para o mundo, a marca vende pela sua própria plataforma online e já conta com mais de 22 mil seguidores no Instagram.

A carioca Think Blue é outra marca especializada em reaproveitamento de matéria-prima e existe desde 2015. Apesar de criar com diferentes tipos de tecidos, seu foco é transformar peças em jeans por conta da durabilidade e resistência do material, aumentando ainda mais a vida útil da peça.

A Brocki é outra marca que vem se destacando na moda brasileira com criações que variam entre técnicas de patchwork e o rework. As vendas são feitas diretamente pelo Instagram.

Por fim, mas não menos importante e também apostando em vendas direta pelo Instagram, a Futuree. A marca existe desde 2018, aposta no reuso criativo de peças garimpadas em brechós e tem envio para todo o Brasil.

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