O que esperar da próxima temporada de semanas de moda

por The Look Stealers

por A LOT OF TROUBLE

Aproximadamente dez motos se enfileiram logo a uma das saídas laterais, entre as motos pessoas se aglomeram, pedestres cruzam, alguns, curiosos, decidem ficar. Na grande Rue Auber o fluxo é intenso, ônibus, carros, outra vez, motos, alguns se aventuram em meio ao tráfego, vindos do Café de la Paix Paris - o show acabou. Entre tantos, algumas dezenas de fotógrafos e jornalistas, modelos correm para as motos, em meio a cliques saem em direção ao próximo backstage, o movimento se dá como uma dança, entre sons que representam a agitação de mais uma manhã - vida normal. Logo mais à frente, cenário enquadrado pela monumental fachada do Palais Garnier, saem convidados, a essa altura, alguns curiosos dispersam, compreendem, é uma das semanas de moda mais importantes do calendário, a Paris Fashion Week. O vistoso edifício, de construção declarada “de utilidade pública”, mesmo que em um ambiente político no século 19, enche os olhos e a Place de l’Opéra, adornado de nobres materiais, mármores de diferentes cores, mosaicos e ouro.

Paris sabe fazer moda, valorizá-la. A moda, assim como a arte, ou talvez, como um meio de expressão artística, é feita de beleza, de graça, intuição, e se dá perante um contexto sócio-cultural que interpreta os acontecimentos de seu tempo.

A moda, em meio a pandemia, não perdeu sua voz, quanto menos se calou, viu, na verdade, sua voz ampliada, aumentar seu alcance. Em contrapartida, profissionais, em um mercado majoritariamente movimentado por freelancers, artistas emergentes, viram seus jobs desaparecem quase do dia para a noite, dias longos que duram, para muitos, de uma temporada a outra, agarrando-se a pequenas oportunidades, enquanto aguarda-se um novo calendário com a expectativa de um melhor cenário.

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Foto: Hailey Bieber, New York Fashion Week, 2018 (Reprodução/A Lot Of Trouble)


Nova York, Londres e Milão, com suas agendas já divulgadas, verão, mais uma vez, suas semanas de moda voltadas à plataformas digitais, à portas fechadas. A capital da moda americana, mantém-se aos quatro dias de costume, mas vê alguns de seus eventos dispersos para meses como abril. Entre tantas marcas, viu-se muitas delas abandonarem os calendários, botando em dúvida um retorno em um futuro pós pandemia. Em Milão, Gucci, Bottega Veneta e Versace são grandes nomes que seguem o movimento que pode vir a ser uma tendência na busca de uma maior liberdade, aliada a diretrizes internas de suas companhias. MFW, ainda assim, verá seus dias cheios, dentre os mais aguardados, Kim Jones terá sua primeira coleção feminina de ready to wear, à frente da Fendi, lançada sem o first row. Com a segunda edição do projeto “We are Made in Italy - The Fab Five Bridge Builders”, o grupo Black Lives Matter, liderado pelos estilistas Stella Jean e Edward Buchanan, seleciona cinco jovens designers negros que apresentarão suas coleções, durante o evento virtual, sendo apoiados por tradicionais fabricantes, dando assim mais um passo pela diversidade no mercado de moda italiano. Em Londres, a fashion week será marcada por um número maior de shows, desfiles masculinos e femininos dividirão a semana, como já se era sabido há tempos, em sua maioria, gravados e sem público, com intervalos de 15 em 15 minutos.

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Foto: Fotógrafos, Paris Fashion Week, 2020 (Reprodução/ A Lot Of Trouble)

Com investimentos financeiros semelhantes aos eventos presenciais, recursos acabam por ser realocados para diferentes necessidades, se antes havia de seguranças a coquetéis pós-show, hoje existem equipes e aparatos para filmar, sejam desfiles tradicionais ou outras formas de linguagem, de modo a representar com a qualidade necessária detalhes antes vistos nas passarelas.

Pré Louis Vuitton Fashion Show, Paris Fashion Week, 2020 - semanas de moda - semana de moda - verão - street style - https://stealthelook.com.br
Foto: Pré Louis Vuitton Fashion Show, Paris Fashion Week, 2020 (Reprodução/A Lot Of Trouble)

Entre um dos primeiros estilistas a cancelar a presença de público em um show, devido aos indícios da disseminação de um vírus, na época, fevereiro de 2020, ainda desconhecido, Giorgio Armani, faz uso de diversos meios para divulgar suas coleções, até mesmo apresentando-as em horário nobre na televisão italiana, dada a importância da moda para o país. O que segundo o mesmo, o interessante sobre o meio digital, é através dele poder levar moda às massas de uma forma democrática. Embora seja ainda um trabalho em andamento, além de comunicar, marcas se viram frente a necessidade de também entreter, tudo, em um curto espaço de tempo. Porém, no que se trata das semanas de moda, o desafio é não esquecer o ponto central, as coleções e tendências que ditarão os novos passos de um mercado que movimenta expressivamente a economia de países como a França, Itália e mesmo o Reino Unido. No qual o BFC, British Fashion Council, órgão que representa a moda britânica, recentemente tem feito relevantes apelos junto às entidades políticas com foco em um apoio a indústria da moda e na defesa de seus talentos criativos que veem seus movimentos restringidos, criando um colapso em uma cadeia de negócios a partir de bloqueios que desafiam a preservação de empresas e indivíduos independentes que fomentam a sua reputação criativa e cultural.

Backstage Toga, London Fashion Week, 2019 - semanas de moda - semana de moda - verão - street style - https://stealthelook.com.br
Foto: Backstage Toga, London Fashion Week, 2019 (Reprodução/A Lot Of Trouble)

Enquanto desfiles presenciais são acessados por um seleto número de convidados e profissionais de moda, torná-los digitais gerou um alcance significativo, em certo senso, dentro de uma sociedade cada vez mais virtual, a solução perfeita. Porém, perde-se o olhar apurado do profissional, que não mais percorre entre uma modelo e outra, mas sim, necessita, a partir de então, que imagens e fichas técnicas lhe tragam informações para discorrer a respeito de coleções. Frente às possibilidades, muitas marcas reinventam maneiras de divulgar suas criações, entretanto mover-se pela internet nos faz pensar em um campo sem leis de gravidade, limites e, por tanto, por vezes sem peso, onde é evidenciado o vazio da não presença, lado a lado a um cenário promissor, mais inclusivo.

Nicole Martine Chapoteau e Nikki Ogunnaike, Paris Fashion Week, 2019 - semanas de moda - semana de moda - verão - street style - https://stealthelook.com.br
Foto: Nicole Martine Chapoteau e Nikki Ogunnaike, Paris Fashion Week, 2019 (Reprodução/A Lot Of Trouble)

A roda da vida de Chagall que cobre a cúpula do Palais Garnier retrata alegrias, tristezas, nossas tragédias, mas também o renascimento, através da representação de diferentes artistas, atualmente, seja ele qual for o meio. O mundo sempre dependerá da maneira como redesenhamos nosso futuro, e, embora o digital tenha, beneficamente vindo para ficar, a força vital, talvez, ainda seja a presença humana.

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