Se você abriu essa matéria, sabemos que a ideia de ter um brechó já passou pela sua cabeça ou talvez seja um projeto no qual você já está trabalhando. Por muito tempo, os brechós eram vistos apenas como uma alternativa acessível para os mais necessitados, que não tinham poder aquisitivo para comprar roupas novas em outros lugares. Mas, anos se passaram e as pessoas finalmente entenderam a mágica de consumir roupas de segunda mão. Além da exclusividade - afinal, você terá uma peça que provavelmente ninguém terá igual - e do preço mais democrático na maioria das vezes, comprar roupas usadas é uma forma consciente e sustentável, que está começando a ter protagonismo no mundo da moda.
Ter um brechó online te permite empreender sem gastar muito de início e ter um retorno financeiro relativamente rápido - não é uma regra, mas acontece em boa parte das vezes. Por outro lado, para quem almeja ter um espaço físico para abrir uma loja nessa proposta, é preciso saber que o investimento inicial vai muito além de um aluguel para pagar.
Para entender as muitas facetas desse tipo de empreendimento, convidamos três experts no assunto, que comandam três diferentes tipos de negócios. Primeiro, a empreendedora por trás do famoso I Need Brechó, Stheffany Wendy, que conta tudo sobre ter uma estrutura física em um dos pontos mais conhecidos de São Paulo. Depois, trazemos algumas curiosidades sobre Leon, o fundador do Brechó Seff, brechó online especializado em itens de luxo. Por fim, a nossa editora de moda e ex-dona de brechó, Ali Santos, que explica quais são os desafios que ela enfrentou durante os anos realizando o sonho de ter uma loja de garimpos.
_brechó em espaço físico
Talvez você já conheça o I Need Brechó, fundado por Stheffany Wendy e localizado no Jardins, um dos bairros mais badalados de São Paulo. Ano passado, a empreendedora contou em uma live no Instagram com a nossa editora de moda, Ali Santos, sobre a história por trás do brechó. A ideia de vender roupas usadas era uma maneira de alcançar um sonho: conhecer Paris. E o projeto acabou dando tão certo que hoje, a loja física da Stheffany é uma das mais celebradas e conhecidas no meio.
Para quem pensa que é só encontrar um achado e vender, a girlboss da vida real garante: "montar um brechó vai muito além de gostar de garimpar, é preciso ter tempo e muita dedicação para aquele produto chegar até seu cliente final." Para Stheffany, "é preciso ter uma rotina para sair em busca de achados - afinal, nem todos os dias encontramos peças perfeitas -, então é preciso constância para poder atender todo o público que consome na sua loja, além de todo cuidado pós-garimpo como higienização, conserto e melhorias."
Diferente de muitos empreendedores do ramo, Stheffany não começou o seu brechó na internet e ainda conta sobre como isso interfere no preço. "Eu comecei o I Need já com loja física e isso tem um custo muito alto, afinal locar um espaço é muito mais do que só o aluguel”, diz, "existem outros gastos para manter algo físico, como água e luz, por exemplo, e é preciso atribuir tudo isso ao preço do produto final."
Sobre as dificuldades em manter uma loja aberta, especialmente em tempos de pandemia, a empreendedora ainda comenta: "Algo que ninguém nunca me contou foi como ter um espaço físico era difícil, as pessoas sempre sonham muito com uma loja de rua, porém dá muito mais trabalho do que as pessoas imaginam."
novidades diárias na arara, café, bolachinhas. enfim, tudo conta muito na recepção do seu cliente.
Hoje o seu negócio não está focado apenas nas vendas da loja física, é possível também comprar pelo site e por DM no Instagram. Aliás, o site, que é uma empreitada recente do I Need, tem uma curadoria especial e diferente do que o cliente encontra no endereço físico e, portanto, é um trabalho à parte. "São peças únicas que temos que fotografar, medir, editar, cadastrar diversas vezes por não termos um estoque da mesma peça", explica.
Mas, para Stheffany, esse trabalho todo ainda não se compara à loja física, que requer tempo integral. "É preciso receber o cliente em um local bonito, amplo, arejado, cheiroso, arrumado, com novidades diárias na arara, café, bolachinhas, água", diz, "Tudo isso conta muito na recepção do cliente, e logo dar essa atenção em tempo integral tira um pouco do 'tempo' disponível para se dedicar ao marketing online e até aos horários para garimpar - a não ser que você tenha funcionários, é claro."
A empresária ainda destaca as dificuldades enfrentadas durante o último ano para manter o seu espaço físico durante a pandemia. "Foi um ano dificílimo para o comércio. Só na nossa rua, cerca de 60% das lojas fecharam e, após um ano trabalhando na medida do possível, o que nos manteve foi a reserva de emergência, as vendas online dos nossos clientes fiéis e os dias que conseguimos abrir a loja física", conta, "hoje, com o lockdown em São Paulo, estamos vendendo apenas online, tentando sempre nos reinventar e estarmos presente nas redes sociais com novidades."
_brechó de luxo online
Sendo uma das maiores referências online no segmento de luxo, o Brechó Seff vende bolsas, joias e roupas de segunda mão, mas com preços bem mais acessíveis. De Versace à Louis Vuitton, os garimpos glamourosos são feitos por Leon, fundador do perfil que hoje conta com mais de 58 mil seguidores.
Comprar em brechós já estava entre os hobbies de Leon e a oportunidade de monetizar e transformar seus garimpos em um verdadeiro negócio surgiu de maneira despretensiosa. "Eu sempre levei de uma forma leve e orgânica", relembra, "ia garimpar por puro prazer e quando vi, já tinha o meu próprio brechó."
Sobre as dores e delícias de ter o seu próprio brechó online nos tempos atuais, Leon admite que "sinceramente, eu amo meu trabalho então gosto de todos os estágios, desde garimpar a postar a peça." E quando perguntamos qual é a parte mais difícil, ele assume que "apesar de trabalhar online ser um privilégio nos dias de hoje, a parte ruim é o fato de ficar muito tempo nas redes, de uma forma nada saudável. Acho que todo mundo que trabalha com internet tem esse problema."
Por outro lado, existe também a melhor parte do trabalho como fundador do Brechó Seff: "Poder achar coisas extremamente raras e exclusivas."
já me arrependi de várias coisas que vendi.
Imagina você estar garimpando e encontrar uma bolsa da Chanel por um preço incrível ou aquela jaqueta Versace super rara. Admita, você pensaria duas vezes antes de colocar à venda, né? Mesmo hoje em dia, saindo para comprar especialmente para o seu próprio brechó, Leon lida com essas dúvidas acerca de achados preciosos. "As coisas mais icônicas e raras, eu sempre guardo", revela, "não vale a pena vender, pois tem peças que valorizam muito a cada ano que passa, então é um investimento, principalmente se é de uma coleção limitada. Existem peças que, se você vender, é muito difícil achar outra igual. Já me arrependi de várias coisas que vendi."
Se há uma costura solta ou um defeitinho - mesmo que simples -, Leon repensa a compra, pois dá preferência para itens em ótimas condições. "Depende muito do item, mas prefiro pegar bolsas, por exemplo, no melhor estado possível para não precisar de reparos ou retoques e isso inevitavelmente desvalorizar a peça", conta, "já vendi bolsas que vieram direto da loja."
As bolsas, inclusive, são praticamente carro-chefe do Brechó Seff. Leon viu uma oportunidade no mercado de luxo de segunda mão por dois motivos, investimento e o amor às grifes. "Artigos de luxo valorizam muito a cada ano, são peças que nunca perdem o valor e têm uma procura absurda, então vale a pena", diz, "virei colecionador quando comecei a saber da história das marcas e suas coleções. Me apaixonei! Cada uma tem seu mundinho, vibes e moods totalmente diferentes. É algo que eu realmente amo!"
_surfando o boom dos brechós online
"Por anos, eu desdenhei de brechós, mas culpo a minha imaturidade por isso. Pois, desde pequena, ia a diversas lojas de segunda mão com a minha avó paterna, que amava comprar roupas usadas por conta do preço", conta a nossa editora de moda, Ali Santos.
Para a Ali, a relação com brechós foi acontecendo conforme ela foi crescendo e se interessando por moda. "Nunca foi uma questão de necessidade financeira, mas a partir do momento em que percebi o poder de uma roupa vintage, a minha cabeça mudou completamente", conta, "comecei a sair para garimpar roupas de marcas ou peças que eram realmente da década de 60 e 70, achava demais comprar um vestido antigo e lindo por R$10 reais."
Depois de adulta, ao perceber o seu potencial em identificar achados preciosos em lojas de segunda mão, Ali decidiu que faria do seu hobby favorito, um negócio. "Eu fui morar em uma cidade no interior e não queria apenas trabalhar para ganhar dinheiro e ser infeliz. Percebi que garimpar me fazia bem e era algo que eu realmente queria e sabia fazer da vida. Então, criei uma nova conta no Instagram e fotografei algumas peças minhas, que eu já não usava mais. Anunciei no perfil e vendi tudo em menos de meia hora! Foi realmente um choque, e amei o fato de estar ganhando dinheiro com algo que eu gostava", explica.
Inspirada, ela começou a garimpar por onde ia. "Se eu fosse para alguma cidade a passeio, logo saía em busca de brechós de portinha, sabe? Aqueles bem escondidos", conta, "ia comprando tudo o que achava legal e que estava em bom estado. Quando chegava em casa, as roupas já iam direto para a lavanderia e, em seguida, eu tirava as fotos para postar. Nessa época, não haviam muitos brechós online, então eu era uma das poucas pessoas que estava empreendendo nesse segmento."
anunciei no perfil e vendi tudo em menos de meia hora! foi realmente um choque, e amei o fato de estar ganhando dinheiro com algo que eu gostava.
Era um tempo em que usar o Instagram para vender artigos de segunda mão era algo novo, mas logo mais pessoas viram um potencial gigantesco - e uma forma de ter o seu próprio negócio com pouco investimento. Para a editora de moda, esse boom dos brechós online dificultou a continuação do seu empreedimento. "Antes, eu postava uma peça e vendia em meia hora. Depois, com muitos concorrentes - que inclusive, podiam garimpar fora do Brasil -, as peças começaram a ficar mais tempo disponíveis. Mesmo assim, fui garimpando mais e mais para ter novidades e conseguir vender algo e me destacar", diz, "só que com isso, acumulei muita roupa e, quando percebi, ter um brechó já não estava sendo mais vantajoso, nem saudável para mim."
O desgaste físico e emocional de empreender sem qualquer direcionamento profissional fez com que a Ali desistisse do seu brechó online. Para ela, foi o momento de "voltar a focar na profissão que era o meu sonho, essa que exerço hoje aqui no STL."
O amor, no entanto, por garimpos e brechós nunca morreu e ela garante que sempre tentará de alguma forma fazer vendas de segunda mão, nem que sejam apenas com peças usadas do próprio guarda-roupa. "Até vendi uns desapegos meus há pouco, mas logo percebi que não tinha mais tempo e paciência para isso. Porém, ainda sonho em ter um cantinho lindo com roupas vintage, um café e uma floricultura em alguma cidadezinha do interior. Só acho que esse é um plano para depois dos 50 anos", conta aos risos.