TBT: Editoras

por Arthur Chini

Quando, há algum tempo, publicamos uma série de matérias sobre o estilo das atuais editoras de diversas revistas de moda, surgiu aqui no escritório uma discussão sobre o enorme poder que elas têm como verdadeiros oráculos de estilo e comportamento. Através das suas revistas, elas não ditam apenas a próxima trend, mas também o próximo hostpot para você passar as férias, o próximo bar que você vai frequentar, até o tipo de vocabulário que você vai usar. Na nossa época, porém, onde a internet e mídias sociais acabaram dando voz e oportunidade de expressão a uma infinidade de outros atores, o poder das editoras certamente foi um pouco diluído. 

Mas houve uma outra era, no que parece o longínquo século XX, em que algumas mulheres concentraram o poder de ditar regras e tendências como ninguém. No TBT de hoje vamos falar um pouco sobre três delas: Diana Vreeland, Liz Tilberis e Beatrix Miller, a tríade das maiores e mais veneradas editoras de moda do século passado. A moda que conhecemos hoje com certeza é uma evolução daquilo que elas imaginaram e produziram décadas atrás.

Diana Vreeland


Diana Vreeland

Diana Vreeland é, sem dúvida alguma, uma das maiores lendas da moda e da indústria editorial. Considerada uma das pessoas mais influentes da moda no século XX, Diana iniciou sua carreira na revista Harper’s Bazaar, em 1936, onde criou a célebre coluna “Why Don’t You...?”, onde ela dava dicas de moda e lifestyle completamente extravagantes e à frente do seu tempo. Ainda na Bazaar, onde logo ela chegou ao posto de editora-chefe, Diana já havia se tornado o maior árbitro de estilo da época, tendo sozinha o poder de definir tendências e estilos que milhares de trendsetters e it girls têm hoje. É um poder que, na era digital em que vivemos, nenhuma outra pessoa vai conseguir concentrar sozinha. Como editora-chefe da Bazaar, Diana ajudou a lançar e consolidar a carreira de ícones como Cher, Twiggy, Marisa Berenson, frequentava a crème de la crème de Hollywood e era definida por seus amigos íntimos, dentre eles Jack Nicholson, Angelica Houston,  Warren Beatty e Clark Gable, como “the coolest of the group”.

Em 1962, a Condé Nast conseguiu tomar Diana da Bazaar, e a chamou para o cargo de editora-chefe da Vogue Americana. Foi durante esse período que Vreeland a transformou na revista de moda mais influente do mundo, com a ajuda de fotógrafos lendários como Cecil Beaton, Richard Avedon e Irving Penn, e editores brilhantes, como André Leon-Talley. Membros do antigo staff que trabalharam com ela na Vogue lembram que Diana se comunicava apenas através de memorandos, pequenas cartas enviadas para o seu time, sempre os instigando a trazer novas e criativas ideias à revista. Ela também pronunciava opiniões sobre absolutamente tudo: como deveriam ser os sapatos, como usar meias, batom, franjas, falando muitas vezes de forma enigmática, outras vezes de forma hilária (tanto que um compilado desses memorandos virou o livro Diana Vreeland Memos: The Vogue Years). Durante seus anos na Vogue, reza a lenda que em todos os desfiles em que ela estava presente, ninguém ousava aplaudir o desfile antes dela, tamanho o medo e admiração que todo mundo tinha por sua figura.

Ao final de sua carreira, após sua demissão da Vogue (como em tudo na vida dela, existem muitas histórias diferentes do motivo da demissão, mas a mais aceita é porque ela estava gastando demais), Diana virou consultora do Costume Institute do MET, em Nova York. Lá ela foi responsável por 11 exibições e por transformar o MET Gala em um dos eventos mais exclusivos e desejados do mundo.  Quatro aos antes de sua morte, que ocorreu em 1989, Diana se recolheu do jet set, e admitia em seu apartamento apenas familiares e amigos muito próximo. Isso só ajudou ainda mais a construir o status de Diana como um ícone cultural, algo que dura até hoje.

Diana Vreeland
Foto: Principais capas de Diana Vreeland para a Vogue America e Harper's Bazaar
Liz Tilberis
Liz Tilberis

A inglesa Liz Tilberis foi, durante muitos anos, editora-chefe da British Vogue, assumindo o posto de Anna Wintour quando ela foi transferida para o comando da Vogue americana. Ela entrou na Vogue na década de 60, quando esta ainda estava sob o comando de Bea Miller, e quase 20 anos depois, em 1987, recebeu a proposta de um cargo - extremamente bem remunerado - no time de design principal da Ralph Lauren, em Nova York. Ela topou, porém dois dias depois recebeu de Anna Wintour a proposta para se tornar editora-chefe. Sob sua direção, a British Vogue ganhou muitos prêmios e aumentou bastante sua circulação, principalmente pela imensa rede de contatos de Liz, em especial sua amizade com a Princesa Diana. 

Nos anos 90 ela virou centro de uma das maiores disputas fashion da história: a Hearst fez uma proposta milionária para ela virar editora-chefe da Bazaar americana, e fazer frente à Vogue de Anna Wintour. Ela topou, e aí iniciou um período de intensa  e silenciosa rivalidade entre a Vogue e a Bazaar. Liz reviveu a Bazaar, uma revista que estava em estado terminal alguns anos antes, e a transformou novamente numa enorme referência em moda. A rivalidade com Anna Wintour aumentou ainda mais quando Liz contratou algumas pessoas da Vogue para seu time, e quando firmou uma longa fidelidade do fotógrafo Patrick Demarchelier para a Bazaar. A primeira capa de Liz para a Bazaar foi histórica: Linda Evangelista, com seu corte bob recém-feito, em um fundo branco e com a chamada "Enter the Era of Elegance". Essa capa foi a principal responsável pela febre do corte bob nos anos 90, e é considerada uma das mais importantes da história da moda. 

Nos seus últimos anos de carreira, Liz enfrentou um câncer de ovário que acabou tirando sua vida em 1999, e ganhou uma admiração e respeito ainda maiores por continuar conduzindo a revista mesmo hospitalizada. 

Liz Tilberis
Foto: Principais capas de Liz Tilberis para a Vogue britânica e Harper's Bazaar
Beatrix Miller
Beatrix Miller

Bea Miller entrou para o hall das grandes editoras de moda após comandar a Vogue britânica por 20 anos, entre 1964 e 1984. Ela iniciou sua carreira em Londres como secretária da revista The Queen (que algum tempo depois viraria a Harper’s Bazaar), onde logo passou a ser features editor. Logo depois, em 1956, ela se mudou para Nova York para trabalhar na Vogue, que estava então sob direção de Jessica Daves. Após um período curto na Vogue US, ela foi chamada para ser editora-chefe da The Queen, revista que passou por uma grande mudança enquanto ela estava no comando, passando a almejar um público mais jovem. O seu trabalho para a Queen foi tão bom que ela chamou atenção da Condé Nast International, e logo foi chamada para ser editora-chefe da Vogue britânica.

Em seu longo reinado na revista, ela a transformou em uma das bíblias da alta-moda, servindo-se muito de sua extensa rede de contatos, que incluía membros da realeza (um dos principais fotógrafos da Vogue na época era Lord Snowdon, marido da Princesa Margaret), atrizes como Sophia Loren, astros do rock e fotógrafos como Helmut Newton, David Bailey e Terence Donovan. Com todos esses contatos, ela foi uma das principais hostess de Londres nos anos 60, dando festas incríveis em seu apartamento na Mulberry Walk, em Chelsea. Dentro da Vogue, não havia uma pessoa em seu staff que não amasse Bea. Conhecida por ser uma excelente profissional, Bea também era uma pessoa muito amigável, fugindo bastante do perfil de editora “diabo veste Prada”. Ela foi mentora de muitos nomes importantes no mercado editorial, como a própria Liz Tilberis e a lendária Grace Coddington, que foi por muitos anos diretora criativa da Vogue America. Muitos diziam que ela se interessava mais por features do que por fashion em si, mas ela sempre soube se cercar de excelentes fashion editors. Após sua aposentadoria da Vogue, em 1984, Beatrix criou um think tank fashion junto com o designer Terence Conran e a famosa estilista britânica Jean Muir, que por anos serviu como ponte entre o governo e a indústria criativa britânica. Ela também serviu como membro do conselho do Royal College of Art de Londres, e em 1986 ganhou o título de Commander of the Order of the British Empire. Bea faleceu em 2014, aos 90 anos.

Bea Miller
Foto: Principais capas de Beatrix Miller para a Vogue britânica
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