TBT: Os Desfiles Mais Importantes da Década de 90

por Arthur Chini

Muitos experts e críticos se referem aos anos 90 como a Golden Age da moda, uma era de supermodelos, budgets enormes e uma imaginação ainda maior. Não havia o escrutínio das mídias sociais e a necessidade de agradar um público cada vez mais amplo e homogêneo, o que dava muito mais liberdade para os designers. O resultado foi uma década com desfiles inesquecíveis, e que mudariam a moda para sempre. Para entrar no mood de mais uma temporada de moda que está chegando, vamos relembrar os 10 maiores desfiles da melhor fashion decade:

Versace Fall 1991 – Freedom!

Versace Fall 1991 Freedom George Michael
Foto: Linda Evangelista, Cindy Crawford, Naomi Campbell e Christy Turlington


Nenhum outro desfile define melhor o fenômeno das supermodelos do que o outono da Versace em 1991. Quem estava presente, até hoje diz que sente falta dos anos 90, por momentos como esse. Não tanto pelas roupas em si, essa coleção foi marcada principalmente pelo momento em que Gianni Versace mandou Linda Evangelista, Cindy Crawford, Naomi Campbell e Christy Turlington para a passarela de braços dados e lyp-synching a música Freedom!'90 de George Michael. Foi o ápice de uma era em que as supermodelos saíram do círculo da moda e se tornaram celebridades mainstream, estrelando clipes - como o próprio Freedom!- , aparecendo em filmes e tendo famosos affairs com a realeza de Hollywood.

Perry Ellis Spring 1993 - Grunge Collection

Perry Ellis Spring 1993 grunge collection
Foto: Christy Turlington

A coleção que fez Marc Jacobs ser demitido da Perry Ellis seria também a mais marcante da carreira do designer, e também uma das mais marcantes da história da moda? Hoje, a maioria dos críticos considera que sim. Na época, a coleção foi rechaçada de todos os lados: jornalistas, editores, buyers, todo mundo condenou os cashmere xadrez e nightdesses inacabados apresentados por Marc. O designer disse que desejava ver as modelos vestindo roupas como elas se vestiriam na rua, despreocupadas e um pouco mais desleixadas. Por isso os chiffons esvoaçantes, camisas xadrez amarradas na cintura, blusões de cashmere oversized e Dr. Martens nos pés. Também foi uma ode à estética grunge, cada vez mais popular pelo sucesso de bandas como Nirvana e filmes como o “Singles” de Cameron Crowe. Os visionários logo perceberam o valor da coleção: Grace Coddington usou algumas peças no editorial Grunge and Glory para a Vogue americana.

John Galliano Fall 1994

John Galliano Fall 1994
Foto: Shalom Harlow e John Galliano

Com apenas 18 looks e pouquíssimos recursos à disposição, Galliano mostrou, no outono de 1994, que não são apenas os big budgets que produzem shows épicos. Na época, John estava novamente à beira do colapso, sem dinheiro e sem o apoio de nenhum financiador. Com a ajuda de alguns amigos importantes, notavelmente Andre Leon Talley e a socialite São Schlumberger, ele conseguiu apresentar um desfile que hoje é considerado um dos mais importantes na história. Os looks eram todos pretos (o único tecido que havia sobrado no atelier de Galliano), e tinham um mood oriental misturado com o glamour dos tailleurs dos anos 40. Todas as supermodelos - Naomi, Kate, Shalom, Christy, Helena - abriram mão do cachê e desfilaram de graça para apoiar Galliano.

Thierry Mugler Fall 1995 – Le Cirque

Thierry Mugler 1995 Nadja Auermann
Foto: Nadja Auermann

Apresentada no Cirque D'Hiver em Paris, a coleção de outono em 1995 da Thierry Mugler teve proporções épicas: mais de 300 looks foram apresentados, com direito a uma performance de James Brown no finale. Na passarela, todas as supermodelos estavam presentes – de Kate Moss a Eva Herzigova – ao lado de musas de diversas gerações, como Jerry Hall, Carmen Dell’Oreffice, Tippi Hedren e Veruschka. Esse desfile também coroa uma era em que as modelos tinham presença na passarela, elas não apenas carregavam as roupas, mas interpretavam um personagem. A variedade de looks incríveis criados por Mugler para essa coleção é enorme, mas dois deles viraram icônicos: o corset metálico usado por Nadja Auermann (foto) e o bodysuit robótico que mais tarde foi fotografado por Helmut Newton.

Gucci Fall 1995

Gucci fall 1995
Foto: Amber Valetta

No início dos anos 90, a Gucci estava à beira da falência e quase entrando na obscuridade do mundo fashion. Até a coleção de outono de 1995, criada por Tom Ford, então diretor criativo, que revitalizou a marca e a tornou, junto com a Versace, um dos maiores símbolos da moda italiana, voltada para uma mulher sexy e poderosa. O desfile dessa coleção é considerado um dos mais sensualizados de todos os tempos, com modelos como Kate Moss e Amber Valetta encarnando o ideal da femme fattale, usando uma maquiagem carregada e roupas que exalavam sexualidade. O que todos consideram genial nessa coleção é que foi uma das primeiras a usar o poder sexual da mulher não para torna-la objeto, mas sim torna-la mais forte, fierce and fabulous.

Prada Spring 1996

Prada 1996
Foto: Carolyn Murphy

A coleção definitiva para a Prada foi sem dúvida a da primavera de 1996, que desafiou diversos padrões e convenções amplamente aceitos na década. Fugindo da mulher sexy - a femme-fatale popularizada por Gianni Versace - Miuccia preferiu um look mais geek, com tailleurs e saias, que na época até podiam parecer caretas, mas viraram sinônimo de cool anos mais tarde. A paleta de cores favorecia tons que não eram considerados muito atraentes, como tons terrosos, verde-musgo, amarelo-queimado, sem brilho e mais opacos. Nos pés, ao invés de stilettos e saltos altíssimos, as modelos usavam sandálias com chunky-heels, que logo foram incorporadas pelas fashionistas. Foi um turning-point decisivo tanto para a Prada, quanto para a moda em geral na época.

Alexander McQueen Spring 1998 - The Golden Shower Collection

Alexander McQueen Golden Shower Collection
Foto: Gisele Bündchen

Alexander McQueen não poderia faltar na nossa lista, afinal, um dos designers mais geniais de todos os tempos pensava em seus desfiles não como uma simples apresentação de roupas, mas sim uma obra de arte, feita para chocar e comover as pessoas. Um dos melhores shows de McQueen, apresentado na primavera de 1998, foi a “Golden Shower Collection”, na época batizada apenas como Untitled, a pedido dos patrocinadores. Foi a primeira vez que McQueen teve budget suficiente para transformar suas ideias em realidade, e o resultado foi um desfile extremamente marcante. As modelos desfilaram em cima de um tanque transparente, em vestidos de couro ornamentados, tailleurs e até um corset feito de ossos humanos.  No final do desfile, as modelos aparecem em roupas brancas extremamente justas, e uma chuva torrencial atinge a passarela, deixando as roupas transparentes, borrando toda a maquiagem dos olhos das modelos, e o tanque onde elas desfilam se enche de tinta negra. É também nesse desfile que uma jovem Gisele Bündchen se consolida como “The Body”, a maior modelo dos anos 2000.

Alexander McQueen Spring 1999 - Nº 13

Alexander Mcqueen nº13
Foto: Shalom Harlow

Outro desfile memorável de McQueen foi o nº 13, que completa uma trilogia de coleções inspiradas nos elementos naturais, sendo essa marcada por um senso estético airy, mais leve que as coleções anteriores. Cheio de transparência, tecidos esvoaçantes e foco nas cores branco, preto e cinza, esse desfile é hoje reverenciado principalmente pelo seu finale, considerado mais performance art do que moda. A modelo Shalom Harlow aparece numa plataforma giratória, usando um vestido anglaise de tule branco, e dois braços robóticos começam a pintar o vestido com tinta negra e amarela. O lendário jornalista Tim Blanks, que estava no desfile, descreveu o momento como “um momento marcante para a cultura pop mundial”.

Dior Haute Couture Fall 1999 - The Matrix Collection

Dior Haute Couture Fall 1999 Matrix
Foto: Carmen Kass

Depois de sucessivas coleções referenciando a opulência e o excesso dos salões e cortes da Era Moderna, como a famosa coleção apresentada na Opéra Garnier um ano antes, Galliano escolheu novos rumos para a Dior, pois atingiu um ponto em que toda a extravagancia estava sendo considerada too much. O set era diferente de tudo o que ele havia feito: apenas uma longa passarela prateada dentro do Palácio de Versalhes. Nos primeiros looks, as modelos evocavam a imagem de uma urban warrior, em capas e jaquetas de couro assimétricas e um mood futurístico que lembravam muito as roupas usadas por Neo, Trinity e cia na trilogia “The Matrix”. Mas havia muito mais going on, pois ao longo do desfile as sequencias de looks transitavam entre roupas clássicas de alta-costura, com incríveis headpieces feitos por Stephen Jones, e looks metalizados, descontruídos, que evocavam uma guerreira moderna. O finale, com Carmen Kass entrando na passarela com um enorme paraquedas rosa, é um dos mais incríveis já vistos em haute-couture.

Yohji Yamamoto Spring 1999 - Wedding Collection

Yohji  Yamamoto 1999
Foto: Andre Leon Talley

Yohji Yamamoto produziu duas wedding collections no final da década de 90, mas a que ficou mais famosa foi a da primavera de 1999. Alguns presentes disseram, mais tarde, que nunca haviam visto tanta gente chorando de emoção na front row como nesse desfile. Mesmo assistindo pelo Youtube, já dá para perceber que a coleção transcende a moda e o consumo, chegando muito próximo da arte. O stage era um espaço amplo, onde as modelos desfilavam lentamente como se estivessem mesmo a caminho do altar. Yohji partiu dos tecidos e formas básicas de vestidos de noiva, como seda marfim, tule e crepe, e deu a eles novas formas e significados jamais vistos: os chapéus dramáticos cobertos por tule, pijama suits e os vestidos que se transformavam ao longo do show. As modelos permaneciam no stage por mais tempo do que o normal, e iam modificando o look, adicionando ou retirando peças de maneiras completamente inesperadas. A descontrução de gênero também marcou o desfile, que hoje é uma das principais referências no tema. Ao final, um cameo do lendário Andre Leon Talley.

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