A geração do caos performático. Estamos fingindo através das roupas?
Nos anos 90, ser party girl era quase um manifesto de identidade. O piercing no mamilo, a tatuagem, a maquiagem borrada e a calça detonada não eram só sobre moda. Eram sobre viver.
E esses detalhes não eram só bonitos e estilosos, eram interessantes porque eles contavam, sem uma palavra sequer, que aquela pessoa tinha vivido, tinha personalidade forte, tinha tomado decisões ousadas. As roupas carregavam narrativas reais que vinham da liberdade da vida noturna, de quem não seguia regras e viveu experiências únicas, intensas e, principalmente, reais! Mas avancemos para 2025. E aí, a coisa mudou, e muito.

O piercing no mamilo virou um acessório decorativo — e falso — em sutiãs desenhados para parecerem ousados, mas que provavelmente só vão ser usados para um vídeo no Tiktok. A maquiagem borrada, que antes era resultado de uma noite tumultuada, agora é um look meticulosamente planejado, aplicado seguindo um tutorial, só pra seguir a trend do momento que é PARECER uma messy girl.

Calças propositalmente manchadas, cabelos bagunçados com perfeição... tudo isso compõe o que chamamos hoje de “estética do caos”, uma performance visual muito ensaiada, um figurino sobre a vida bem vivida de alguém que nada viveu.
O mais irônico disso tudo? Enquanto nos vestimos para contar histórias de uma vida que parece intensa, os dados e pesquisas dizem o contrário. A geração z está cada vez menos nas baladas, o consumo de álcool caiu, as festas perderam espaço para rotinas de autocuidado, meditação, pilates e sono de qualidade.
Leia também: O que é dismorfia financeira e como ela está afetando a Geração Z

A geração que está por trás dessa estética do caos e da rebeldia simulada vive uma realidade oposta: cuida da pele, toma suco verde e lê livros de desenvolvimento pessoal. E não há nada de errado nisso, mas, aparentemente, é mais legal parecer caótica no look do que admitir que rolar o feed não é história para contar.
É uma simulação generalizada. Online e offline. Tudo gira em torno de parecer. Parecer intensa. Parecer rebelde. E isso tá tão, mas tão enraizado, que a calça manchada da Acne Studios esgotou. O sutiã com piercing fake da Skims virou sold out em questão de horas. E aquele tênis destruído da Balenciaga foi assunto não só dentro, mas até fora da bolha da moda. Todo mundo falando, todo mundo desejando. Porque no fim, a experiência virou só mais um produto e tá todo mundo comprando.
Essa dualidade não é um mero acaso, ela reflete um momento cultural onde a imagem, o branding pessoal e o performático se tornaram tão importantes quanto, ou até mais, que a própria experiência. Vivemos numa época em que as aparências valem mais que a realidade, onde o look não é só uma expressão pessoal, mas um roteiro visual de quem gostaríamos de ser.
Nos tornamos uma geração que coleciona referências visuais, mas não coleciona memórias e, pra aliviar o desconforto disso, seguimos comprando roupas como quem compra experiências.
No fim, a pergunta que fica é: você tá vestindo quem você é, quem você gostaria de ser... ou quem você quer que os outros acreditem que você é?
