Fundada por Manfred Thierry Mugler nos anos 70, a marca é venerada por suas criações futuristas — e controversas — fruto de seus interesses variados que iam de filme noir à super-heroínas, sempre imbuídas de construções arquitetônicas e transbordando glamour. Atualmente, a marca é assinada por Casey Cadwallader ,que dá continuidade ao legado do nome. A seguir, te contamos tudo sobre a história da Mugler, tema da nossa #STEALTHECLASS do mês.
a origem
Manfred Thierry Mugler nasceu em Strasbourg, França, em 1948. Desde criança demonstrou interesse pelas artes performáticas, tornando-se bailarino aos 9 anos, aos 14 passou a integrar o corpo de ballet da ópera de sua cidade natal onde atuou durante 6 anos. Nos anos 60, partiu para explorar outras possibilidades, morando por um período em Londres e então se estabelecendo em Paris. Por lá, estudou design de interiores, trabalhou como fotógrafo e passou a desenhar croquis trabalhando como freelancer em marcas variadas. Criativo e inquieto, logo sua originalidade falou mais alto e o jovem decidiu se lançar na moda.
o início
Fundada em 1973 com o nome "Café Paris", foi em 74 que a marca ganhou o nome do fundador e apresentou a primeira coleção ready-to-wear. Despontando na cena ao lado de outro mestre, Azzedine Alaia. Suas criações, que destoavam do clima folk de nomes populares da época como Kenzo, rapidamente chamaram atenção pelo caráter único e ajudariam a definir a estética dos anos 80.
códigos e marcas registradas
“Eu sempre fui fascinado pelo animal mais belo do planeta terra: O ser humano”, a frase dita pelo estilista resume bem suas criações magníficas e seu talento visionário. Unindo referências improváveis, mas complementares no universo concebido ao longo de seus 50 anos de atividade.
Futurismo e ficção científica eram temas latentes em suas coleções, alimentados pelo interesse em filmes como Metrópolis e Barbarella.
Do cinema, filmes noir e a elegância misteriosa de suas protagonistas. Ávido leitor de histórias em quadrinhos, as super-heroínas também faziam sua cabeça, em especial personagens como mulher-gato.
O arquétipo da Femme Fatale era um de seus favoritos e ele foi responsável por introduzir materiais como couro e latex ao mainstream.
O clima fetichista culminou em uma das parcerias mais importantes, com o lendário fotógrafo alemão Helmut Newton. As imagens geradas pela dupla figuram entre as mais icônicas da história da moda.
Deliciosamente perversos e impossivelmente chiques, força e imponência são características inerentes a todos designs do estilista. Não é exagero comparar suas roupas à obras de arte com peças que parecem esculturas, a construção impecável pode ser atribuída ao interesse por arquitetura que resultou em uma silhueta audaciosa e singular, de ombros pronunciados e cintura marcada.
O corselet é figura central no trabalho de Mugler, sendo reinventado inúmeras vezes ao longo dos 30 anos da marca sob comando do fundador. Desde o fim dos anos 80, eles eram fruto da colaboração com Mr. Pearl, nome fundamental da moda, expert em espartilhos. A coleção de 1997 foi marcada por um dos resultados mais magníficos e emblemáticos da parceria, a criatura com lentes de contato amarelada usava look híbrido entre serpente, peixe e besta. a peça levou 6 semanas para ser confeccionada por um time de 20 pessoas trabalhavam 24 horas por dia se revezando em turnos diurnos e noturnos.
Mr. Pearl em ação finalizando look de coleção de 1998, o catsuit é inspiração direta dos atuais assinados por Casey Cadwallader.
Precursor do naked dress, que já tinha surgido nos figurinos de Cher assinados por Bob Mackie nos anos 70 e remeteram à looks usados por dançarinas nos anos 30. Porém, as versões assinadas por Mugler se assemelham mais ao modelo celebrado hoje em dia. Glamour e silhuetas bodycon, que marcam bem o corpo, eram constantes em suas coleções, assim como recortes escandalosamente generosos.
Motocicletas e carros também tiveram vez e estimularam sua criatividade inesgotável.
O lado dark convivia lado a lado com uma energia contagiante com criações irreverentes e coloridas, mostrando toda a versatilidade de Mugler. Valia tudo, desde que resultasse em espetáculo, não é à toa que as show girls eram grandes inspirações.
Espaço sideral e a vida em outros planetas.
A moda western, elevando o clima cowboy para outro patamar, com ainda mais glamour.
Por trás de todo teatro, existem peças impecavelmente construídas e a pureza e precisão dos cortes deslumbra.
alta-costura
Em 1992, Monsieur Mugler se tornou o primeiro estilista de ready-to-wear convidado para participar do calendário de alta-costura sob a benção do órgão regulador oficial, a Chambre Syndicale de la Haute Couture e entrando oficialmente no seleto time em 1996. Trazendo seu olhar provocativo e único para o universo couture:
a arte do espetáculo
O background de bailarino e a veia para espetáculos fez com que seus desfiles ultrapassassem o formato de um desfile normal, tornando-se verdadeiros shows. Alguns chegando a durar 60 minutos comparado aos 15 minutos usuais. Inclusive, em 1984, ele celebrou o aniversário de 10 anos da Mugler abrindo as cortinas para o público geral, apresentando coleção para 6 mil pessoas, metade delas de convidados pagantes.
Já na comemoração de 20 anos, em 95, ele apresentou mais de 300 looks em um casting repleto de personalidades, seu intuito era mostrar a beleza em várias idades. Por exemplo, suas musas como Jerry Hall e Iman, novas sensações como Kate Moss e lendas como Carmen Dell'Orefice e Tippi Hedren — ambas então com mais de 60 anos —, cruzaram o palco, e o gran finale contou com performance de James Brown.
planeta mugler
A riqueza da sua imaginação ia além dos designs. O planeta Mugler, como ele gostava de se referir à marca, era povoado por pessoas interessantes sem exceções. Drag queens, supermodelos, estrelas pornô, rockstars em um casting de gêneros, biotipos, raças e idades distintas tinham espaço.
por trás das lentes
Além do talento inegável para design, Mugler também se tornou fotógrafo exímio, assinando muitas das campanhas da própria marca em locações deslumbrantes e ângulos completamente inovadores.
nasce uma estrela
Apesar das imensas contribuições para a moda, seu papel no mundo dos cosméticos é ainda mais significativo, em particular das fragrâncias. Seu primeiro lançamento ocorreu em 1990 ao lado do grupo Clarins, que eventualmente compraria a Mugler em 1997.
O fenômeno Angel foi seu primeiro lançamento e figura até hoje no top 5 dos mais vendidos do mundo. O intuito era um perfume tão delicioso que desse vontade de comer e após 600 tentativas, uma fórmula que inclui caramelo foi a eleita, instituindo a categoria de perfumes de aroma gourmet. O frasco característico em formato de estrela é dos mais inesquecíveis. Em 2005, outro best-seller, o perfume 'Alien', foi lançado.
a semi aposentadoria
Em 2003, exausto do novo calendário da moda que exigia uma média de 8 coleções por ano, o designer alegou que não queria fazer parte do sistema que prioriza lucro à criatividade e inovação , desaparecendo da vida pública e só retornando em 2009, agora usando apenas o nome de Manfred e aceitando convites escolhidos a dedo. Entre eles, roupas para o espetáculo adulto do Cirque de Soleil e atuando como consultor artístico de ninguém menos que Beyoncé, assinando figurinos para a turnê "I am…World Tour".
revival vintage
Mesmo com o legado inegável, as gerações mais novas prestaram atenção à marca graças à ascensão do mercado vintage nos últimos anos, renovando o interesse na etiqueta. Dois dos momentos mais icônicos da cultura pop recentes foram a bordo de looks do arquivo Thierry Mugler.
Em 2019, Cardi B — usando vestido de 1995, inspirado no famoso quadro "O nascimento de Vênus" de Botticelli — fez história ao se tornar a primeira mulher a receber o prêmio de melhor álbum de rap do ano na cerimônia do Grammy.
Kim Kardashian viveu momento sereia no MET Gala do mesmo ano, com a temática Camp, convencendo Manfred a criar um look inteiramente novo para a festa, o resultado não decepcionou e o vestido de aparência molhada é inesquecível.
A parceria resultou em uma amizade entre a dupla e Kim surgiu com vários looks de arquivo Mugler para prestigiar o amigo.
O estilista faleceu em janeiro de 2022, aos 73 anos de idade. Sua trajetória inspirou muitos dos maiores nomes da moda e suas criações visionárias continuarão causando impacto nas novas gerações.
a nova era
Em 2010, Nichola Formichetti, ex stylist de Lady Gaga, assumiu o comando da marca mudando o nome para simplesmente Mugler. Após alguns anos no cargo, foi substituído por David Koma, que ficou por lá de 2014 a 2017. Porém a marca só retornou ao centro do zeitgeist com o apontamento de Casey Cadwallader em Dezembro de 2017.
a era casey cadwallader
O americano chegou na Mugler com currículo invejável que conta com passagens por Marc Jacobs, Loewe e Acne Studios. Individualidade é palavra-chave no vocabulário de Cadwallader, que afirma a necessidade de focar nos códigos únicos da marca para assegurar seu espaço, mas sem ficar muito confortável. Ex-arquiteto, sua sensibilidade estética se alinha perfeitamente com a do fundador.
A proposta é continuar a evolução da visão estabelecida por Thierry, honrando principalmente o olhar futurista. Na prática, os elementos fundamentais do legado do fundador se fazem presentes, mas de maneira mais realista e usável. As inovações não chegam tanto aos shapes, e sim no desenvolvimento de tecidos tecnológicos como jersey transparente e a meia calça modeladora feita de um mesh quase indestrutível. E na apresentação visual, atualizando a linguagem da marca para o novo milênio, seus vídeos de coleção são de tirar o fôlego.
Fascinado por roupas esportivas, ele se preocupa com a construção das peças para permitir movimento comparando o processo com a arte de confeccionar figurino para shows, essa preocupação atraiu desde Beyoncé, uma das primeiras a vestir a era Cadwallader para Mugler, seguido por nomes como Rihanna, Miley Cyrus, Rosália, Anitta e Rina Sawayama.
Dua Lipa com catsuit que virou marca registrada da atual fase da marca, mas com update graças à aplicação de cristais, 120 mil deles mais precisamente. A cantora usa o look sob medida na sua nova turnê.
Além do catsuit e da meia-calça, o jeans com recortes idealizado por Wadllader se tornou hit de vendas atualizando o item casual mais clássico que existe.
O toque athleisure chic é complementado à alfaiataria estruturada que é sinônimo com o nome Mugler.
Reafirmando e atualizando os códigos estabelecidos da marca com interpretações de sexualidade, feminilidade e body positivity. Estética extrema e igualmente inclusiva, diversidade era ponto importante na trajetória da marca desde sua concepção e também é essencial na visão de Casey. Seus desfiles contam com multiplicidade de gêneros, biotipos, raças e faixas etárias cultivando senso de comunidade.
Entre suas musas, mulheres trans como Hunter Schaffer e Dominique Jackson.
Modelos populares de hoje em dia como Bella Hadid.
Supermodelos dos anos 90 como Amber Valletta.
Popstars de biotipos variados como a francesa Yseult.
Sob comando do americano, a marca tem expandido sua gama de produtos através de parcerias bem-sucedidas com outros players da indústria como a alemã Wolford, nas meias calças com painéis contrastantes e Jimmy Choo na recém-lançada coleção de sapatos.
quer mais?
Para seguir: @muglerofficial - conta oficial
@cadwallader - Instagram do atual diretor criativo
@manfredthierrymugler - a conta do fundador ainda é mantida, apesar de não ser mais atualizada.
Para assistir: A maior parte dos desfiles históricos de Mugler estão disponíveis no YouTube e são uma verdadeira aula de moda.
O clipe Too Funky de George Michael, dirigido por Mugler e contando com as maiores supermodelos da época e estrelas drag: