Intitulado 'Schiaparalien', o desfile que inaugurou a semana de alta-costura em Paris deixou muitas pessoas, inclusive nós, viajando nas estrelas. Essa sensação, muito provavelmente, era a intenção de Daniel Roseberry, que parece ser incapaz de falhar ao conceber seus desfiles e coleções. É claro que não queremos impor uma responsabilidade desmedida sobre o diretor criativo; no entanto, seu olhar e respeito pelo passado da maison apenas reforçam seu incansável empenho em surpreender.
Ao abordar o passado da Schiaparelli, é sabido que Elsa tinha uma certa afeição ao surrealismo e aos astros. Dito isso, um fato curioso é que seu tio, Giovanni Schiaparelli, era diretor de um observatório em Milão, despertando, assim, o interesse da sobrinha, que passou a incorporar muitos desses elementos em suas coleções.
Roseberry pensou em cada detalhe, transformando seu desfile em um encontro com o 'de volta para o futuro'. Sua apresentação destacou a modernidade, a tecnologia, os astros e até mesmo referências de sua cidade natal, as quais detalharemos mais adiante.
Possivelmente, a peça que mais capturou a atenção de todos foi o vestido completamente adornado por elementos tecnológicos "ultrapassados", como CDs, calculadoras, placas-mãe eletrônicas, celulares flip e até mesmo alguns espelhos. Em uma entrevista, o diretor criativo compartilhou que a inspiração por trás dessa peça e de seu bebê robô surgiu da reflexão sobre o que significa ser "criativo e humano na era do aprendizado das máquinas".
"Porque o que nos diferencia como humanos são as nossas memórias. Eu penso nisso como na música – como em um álbum onde você tem todas essas referências diferentes sendo misturadas. E então, a composição é algo que parece verdadeiramente original, uma caligrafia que se destaca como única na coleção da maison. Ao explorar os looks, é como um tesouro de referências pessoais entrelaçadas com o passado", comentou o estilista à Vogue.
Abrindo alas para o vestido acima, a modelo Maggie Maurer estava no centro das atenções, segurando no colo um boneco robô, um artefato que também intrigou o público. Intitulado 'The Mother' (A Mãe), aqui, os mesmos elementos presentes no vestido compunham o bebê robô. Esse visual foi uma homenagem de Roseberry a Sigourney Weaver como Ripley, no filme 'Alien', obra que o diretor afirma ter assistido pelo menos seis vezes.
Pequenos discos dourados exibindo o logotipo da casa riscado ao meio foram utilizados como convites por Roseberry, alinhados a todos os pensamentos por trás da coleção. Essa escolha remete aos 'Voyager Golden Records', dois discos idênticos enviados ao espaço a bordo da espaçonave Voyager em 1977. Esses registros continham gravações representativas da vida na Terra, destinadas a serem descobertas por seres extraterrestres.
Nas notas do programa, o designer também detalhou a afinidade de Elsa Schiaparelli com a astrologia, destacando que o espaço sempre foi um tema recorrente e significativo na identidade informal da maison.
A conexão com os astros, ao ser observada superficialmente, pode parecer inexistente. No entanto, ao examinar minuciosamente os vestidos esculturais, com construções alienígenas, golas altas e adereços, não é difícil perceber – e imaginar, pois esse aspecto é crucial – que essas roupas poderiam facilmente fazer parte de um filme, como é o caso de Duna, por exemplo.
As fivelas que ornamentaram alguns looks são uma homenagem à sua cidade natal no Texas, nos Estados Unidos. A tendência cowboy parece estar em ascensão, e não são apenas as fivelas que evidenciam isso, mas também o emprego das franjas em alguns dos conjuntos.
Seria clichê e até um pouco óbvio demais afirmar que o desfile de Roseberry é "fora deste mundo"? Talvez, mas seu olhar constante e perspicaz no diálogo entre passado e futuro, suas criações avant-garde e críticas subentendidas posicionam o diretor criativo como uma das mentes mais inovadoras do ramo atualmente. A coleção de alta-costura evidencia que o céu é o limite para a grife, ou melhor, que os astros além deste universo o são.
