Que moda é linguagem, todo mundo já sabe. Representando nossos valores, crenças e posicionamentos, o fato se torna infinitamente mais importante quando falamos do estilo das primeiras-damas. Afinal, querendo ou não, o que elas vestem será interpretado como um statement político, diplomático e cultural.
E, com a posse de Donald Trump hoje, assumindo seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos, os olhos se voltam também para Melania Trump. A primeira-dama surgiu usando um conjunto de saia, blusa e casaco sob medida em azul-marinho e marfim, complementado por um chapéu de aba larga assinados pelo designer nova-iorquino Adam Lippes. A escolha pela marca independente de Nova Iorque está mais alinhada ao discurso do marido, que prega o fortalecimento da indústria local – algo que não era evidente nas escolhas da primeira-dama durante o primeiro mandato, quando ela preferia estilistas europeus.
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Provavelmente uma resposta aos anos de polêmicas fashionistas, como a famosa parka com os dizeres “I really don’t care, do u?” (“Eu realmente não me importo, e você?”), usada em 2018 durante uma visita a um abrigo para crianças imigrantes – um dos maiores faux pas na história recente. O mundo viu, criticou, e a mensagem - literal e figurativa- foi catastrófica.
Além do bom senso esperado, existem muitas regras a serem respeitadas quando se assume essa posição. Algumas são explícitas, outras subentendidas, e claro, variam de país para país. Em momentos de crise econômica ou tragédias, roupas austeras são priorizadas, enquanto motivos alegres ou uma cartela de tons patrióticos aparecem em grandes celebrações.
As principais mensagens e metas do governo também podem ser traduzidas nas roupas. Jackie Kennedy, por exemplo, usava cores vivas e cortes modernos para a época para representar o otimismo e a esperança do mandato de JFK. Já Michelle Obama, com marcas mais acessíveis e de origem norte-americana, como as luvas J.Crew usadas na posse do marido, sinalizou que seu tempo na Casa Branca carregava uma bandeira de mudança e inclusão.
Do comprimento das mangas ao nível de casualidade permitido, tudo é considerado, tornando o processo de decisão do que vestir bem delicado. Em visitas internacionais, a atenção é ainda mais necessária: cores e silhuetas são escolhidas para respeitar tradições e homenagear o país anfitrião. Jill Biden, por exemplo, escolheu um vestido de alta-costura Schiaparelli para um jantar oficial na França. A maison é baseada em Paris, mas seu diretor criativo atual é o texano Daniel Roseberry – diplomaticamente destacando as duas nações. De cuidados com a rígida etiqueta britânica em visitas à família real a elementos de modesty fashion no Oriente Médio, as primeiras-damas adaptam seus estilos ao contexto, usando peças recatadas, tecidos opacos e, idealmente, cobrindo a cabeça.
Aqui no Brasil, a primeira-dama Janja Lula da Silva prioriza estilistas nacionais em looks que valorizam a produção local e exaltam a cultura brasileira. O hábito de usar designers do próprio país é praticamente uma regra não escrita, assim como peças com estampas que remetem às suas paisagens e territórios.
Nossa primeira-dama anterior, Michelle Bolsonaro opta por um estilo mais conservador e delicado, preferindo itens clássicos do guarda-roupa e tons mais sóbrios. Seus detalhes favoritos são bem femininos e tradicionais como brincos pequenos de pérolas e decote ombro a ombro.
Lá fora, Michelle Obama deu exemplo durante seus anos na Casa Branca, com roupas cuidadosamente selecionadas para refletir progresso e diversidade, misturando estilistas emergentes e nomes consagrados. Mas foi após deixar o cargo que ela realmente se estabeleceu como fashion icon. Livre do protocolo, adotou um estilo mais ousado e poderoso, com brilhos, peças statement e modernidade irreverente. Ela manteve o refinamento, mas numa versão bem mais fashionista.
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Porém, nenhuma primeira-dama é referência maior do que Jackie Kennedy. Seus tailleurs, óculos oversized e vestidos minimalistas redefiniram o que significava ser uma mulher influente nos anos 1960. Mais do que estilo, Jackie deixou um legado de sofisticação atemporal, que até hoje inspira mulheres em posições de poder.
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Vale lembrar que a pressão de usar a moda como ferramenta política não é exclusividade das primeiras-damas. Já falamos sobre os códigos incluídos no estilo de Kamala Harris e como lideranças femininas precisam pensar em cada detalhe do que vestem. Afinal, seus looks serão interpretados independentemente das intenções originais. Por isso, inserir mensagens em suas escolhas é uma ferramenta valiosa, com o poder de construir pontes, fortalecer identidades ou, infelizmente, criar polêmicas.