Recessioncore: a sutil arte de vestir crises econômicas

por Carol Johansen

Recentemente, ao abrir minhas redes sociais, me deparei com uma colagem em uma das contas dedicadas a lifestyle e inspiração. O moodboard se destacava de outros que já havia visto por não trazer peças de roupa, acessórios ou objetos, mas sim comidas como frutas, vegetais, ovos e chocolate. Isso me lembrou de um vídeo que assisti alguns meses atrás, no qual um analista de marketing falava sobre suas apostas para o ano de 2024. Entre elas, ele citava o uso de comidas como objetos. Como previsto, este ano temos visto muitas celebridades “ostentando” suas geladeiras, e comidas orgânicas e de maior qualidade têm aparecido com frequência em posts de redes sociais. O recessioncore, traduzido para “tendência de recessão”, engloba algumas tendências que refletem períodos de recessão econômica e crises políticas na moda. Paulo Mendes, professor de História da Moda, explica: “A moda invariavelmente é um reflexo da política e da economia, e por isso esse momento que observamos na indústria não deve ser tratado como somente uma tendência de vestuário.”

Desde o ano passado, temos visto um movimento crescente voltado para tendências sem excessos nem ostentação, fundamentado na excelência, consciência e no refinamento. Com o período atual de estagflação econômica, pobreza extrema e crises econômicas e políticas ao redor do mundo, nossa sociedade tem demonstrado cada vez mais insatisfação com espetáculos de grandeza e desperdícios. É nesse contexto que surge a volta do Quiet Luxury. Houve uma mudança drástica no comportamento das celebridades e influenciadores, refletindo este movimento. Apesar de ainda termos a presença de tendências passageiras, observamos cada vez mais pessoas usando peças mais simples e “coringas” e prezando pela construção de guarda-roupas inteligentes.

Mondepars, desfile da Sasha Meneghel
Foto: Mondepars (Divulgação)


correlação entre a altura dos saltos altos e o estado da economia

Concomitantemente, Trevor Davis, especialista em produtos de consumo da International Business Machines Corporation, realizou um estudo a partir de softwares que concluiu que, historicamente, parece haver uma correlação entre a altura dos saltos altos e o estado da economia. Ele observou que os saltos aumentavam em períodos de recessão. Essa pesquisa foi feita analisando o que era comentado entre as pessoas nas redes sociais, editoriais e revistas. Também foi considerado o que estava sendo observado nas passarelas e nas coleções apresentadas nas semanas de moda, além dos itens mais consumidos pelo público. Davis afirma que, durante crises econômicas, é comum que o tamanho dos saltos tenda a subir e permanecer alto, à medida que os consumidores se voltam para uma moda mais extravagante como forma de fantasia e fuga, com sapatos capazes de "levá-los aos céus". Vimos essa realidade não muito tempo atrás, no período pós-pandemia, no qual os sapatos mais queridinhos eram os tamancos e as plataformas.

Pessoa vestindo suéter de malha branco, saia midi branca com textura floral, sapatos de bailarina vermelhos e boné vermelho. Carrega uma bolsa de palha e usa óculos de sol. Visual casual com toques de moda sustentável e detalhes coloridos.
Foto: @linda.sza (Reprodução/Instagram)

apostas de tendências para 2025

Embora tenhamos visto um retorno dos flats no último ano, começamos a notar um aumento gradual no uso de mules e o abandono das sapatilhas. Vale lembrar que as mudanças na altura dos sapatos não ocorrem de forma instantânea, demorando alguns meses após uma crise para se manifestarem.

Minhas apostas são na volta dos calçados altos ainda no final deste ano ou como tendência para 2025. Além disso, muitos têm postado e comentado sobre a volta de algumas tendências observadas no recessioncore de 2008, causado pelo colapso de importantes instituições financeiras em todo o mundo devido ao estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos. A altura média dos saltos femininos nesse período atingiu seu ápice, com saltos de média de 18 centímetros. Nas passarelas, também vimos muita extravagância e narrativas fantasiosas, e a pessoa que melhor representou esse momento foi Lady Gaga. Foi somente em 2011 que os calçados atingiram, em média, cinco centímetros.

É evidente que a moda e o comportamento do consumidor são profundamente influenciados pelos contextos econômicos e políticos que os cercam. A ascensão do recessioncore e do quiet luxury são exemplos claros de como os períodos de crise provocam uma busca pela simplicidade, excelência e funcionalidade, enquanto a extravagância dos saltos altos sinaliza uma tentativa de escapismo através da fantasia. Observamos que, mesmo em tempos de austeridade, a moda encontra formas de refletir e reagir às circunstâncias sociais, mostrando resiliência e adaptabilidade. Esta dualidade entre a procura do luxo contido e a tendência para elementos extravagantes ilustra a complexidade e profundidade das influências econômicas na moda.

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