Moda e red carpet: a indústria bilionária por trás dos looks

por Beta Weber

Pense rápido: o que você acha que faz uma marca se destacar mais rápido, um desfile viralizar ou uma celebridade usar um look no tapete vermelho? E quando o assunto é vender? O red carpet é, hoje, a maior passarela do mundo. O que começou timidamente nos anos 90 virou uma engrenagem global. Estilistas, stylists, agentes, ateliês, contratos e voos internacionais, tudo a serviço da causa. Afinal, a pessoa certa, com o vestido certo, no evento certo, pode transformar um clique de segundos em milhões.

Toda primeira segunda-feira de maio, amantes da moda e da cultura pop param para acompanhar a chegada das estrelas na escadaria do Metropolitan Museum. E o impacto disso se mede em números. Segundo a plataforma Launchmetrics, a Louis Vuitton gerou o equivalente a 55,2 milhões de dólares em mídia espontânea por vestir Zendaya, Lisa, Sabrina Carpenter e Doechii no Met Gala deste ano com Pharrell Williams, diretor criativo da linha masculina da marca, como um dos co-chairs. Um baita negócio. Ao alinhar a mensagem que deseja transmitir com o talento que a representa, a marca garante relevância, gera hype que se converte em venda e sustenta um capital cultural em constante renovação.

Liz Hurley no red carpet
Foto: Liz Hurley (Getty Images)


Para falar sobre a origem desse fenômeno, precisamos voltar para 1994, quando Liz Hurley surgiu a bordo de um vestido Versace preto que era tudo, menos básico. O modelo, com a lateral presa por alfinetes dourados, era um mix de punk com sex appeal que escandalizou e encantou a mídia da época, estampando jornais e revistas ao redor do mundo e catapultando dois nomes até então pouco conhecidos ao estrelato: a atriz e a marca italiana, ambas em início de carreira. Um momento aparentemente corriqueiro, a pré-estreia de um filme, acabou se tornando um acontecimento que mudou para sempre a relação entre moda e celebridades.

Casal elegante em um red carpet, ela com vestido amarelo e ele de smoking, cercados por outros convidados.
Foto: Nicole Kidman (Getty Images)

Se esse foi o catalisador, o boom mesmo veio três anos depois, na cerimônia do Oscar de 1997, quando Nicole Kidman roubou a cena vestindo um couture verde pistache de John Galliano para Dior. A aparição expôs a maison francesa a uma audiência de aproximadamente 54 milhões de mulheres. Um público que, cá entre nós, em sua maioria, não podia comprar uma peça da maison, mas podia sim se sentir parte do universo dos sonhos por meio de pontos de entrada como um batom, um rímel ou um frasco de perfume. O look era inacessível. O desejo, não.

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Mulher em vestido cinza elegante em evento formal, cercada por fotógrafos e decoração floral, simbolizando glamour de red carpet.
Foto: Kendall Jenner (Getty Images)

Aliás, foi nesse mesmo período, pré-redes sociais, que atrizes começaram a tomar o lugar de modelos nas capas de revistas. Não era só sobre rosto bonito: era sobre influência e alcance. O rosto que vendia um filme agora também vendia moda. E o tapete vermelho, se tornou a vitrine ideal. 

De volta aos tempos atuais, se o impacto já é inestimável para marcas estabelecidas, imagine então para estilistas independentes. Harris Reed, por exemplo, vestiu Harry Styles quando ainda estava se formando. Hoje, é diretor criativo da Nina Ricci e comanda sua própria marca. No último MET, Kendall Jenner usou um look da britânica Torishéju, que gerou 6,6 milhões de dólares em mídia espontânea para a marca. O tipo de projeção que uma campanha, sozinha, dificilmente entrega.

Mas não são apenas as marcas que se beneficiam. O esquema é uma via de duas mãos. Estratégias de posicionamento de imagem influenciam, e muito, as escolhas. Um visual alinhado a uma maison tradicional pode ser o passo para consolidar presença no mainstream, principalmente para quem busca uma imagem comercial de movie star. Já o mix de marcas mais cool ou nichadas costuma ser a aposta de quem mira em uma vibe mais indie, com ambições voltadas a produções independentes e de prestígio.

Além disso, o fenômeno do method dressing, vestir-se de maneira que remete aos temas e ao universo de um filme ou personagem em divulgação, é cada vez mais comum, provando que a roupa também passou a fazer parte da narrativa estratégica de carreira e lançamento de projetos. É fantasia com contexto. Estilo com storytelling. Como bem ilustrou Margot Robbie na turnê de Barbie e, recentemente, a dupla Cynthia Erivo e Ariana Grande na promoção de Wicked.

Scarlet Johansson no red carpet
Foto: Scarlet Johansson (Getty Images)

A potência do tapete vermelho vem tornando os contratos de exclusividade entre maisons e celebridades algo inescapável. Louis Vuitton com Zendaya e Emma Stone, Dior com Natalie Portman e Jennifer Lawrence, Prada com Scarlett Johansson para citar alguns. O investimento, altíssimo, compensa e garante exclusividade ou, no mínimo, prioridade nos looks. E é por isso que fica difícil para nomes menores entrarem na competição, já que, além do acesso, é preciso contar com criatividade, persistência e, muitas vezes, sorte. A marca costuma arcar com o envio internacional das peças do ateliê para a stylist, além dos custos com provas, ajustes e possíveis alterações. Para piorar, agendas imprevisíveis, mudanças de calendário e até de localização podem inviabilizar completamente a participação de talentos emergentes no jogo.

Atriz em vestido brilhoso azul com detalhes brancos em eventos de red carpet, uma das vezes usando máscara.
Foto: Cate Blanchett (Getty Images)

E quem está por trás orquestrando todo o mise-en-scène? Até meados dos anos 90, era comum que celebridades comprassem os looks que usariam. Não havia ainda o glamour sistematizado que hoje envolve cada aparição. A profissionalização desse ecossistema culminou na ascensão dos celebrity stylists, figuras centrais na construção da imagem pública de uma cliente, de acordo com suas ambições e planejamento de carreira.

Hoje, a maior parte das produções é emprestada diretamente dos desfiles, em forma de samples, sob o controle de times de relações públicas poderosíssimos. Por isso é raro ver duas pessoas com o mesmo look em um evento. Em outros casos, as peças são feitas sob medida para aquele nome, em colaboração entre stylist e ateliê. E isso abre outro capítulo: dependendo do porte da estrela, várias opções sob medida são produzidas por marcas diferentes e a decisão final só acontece no dia, sem garantia.

O red carpet também se tornou uma plataforma para expor pensamentos e apoiar discursos. Cada vez mais, as escolhas têm a ver com representatividade, dando visibilidade a criadores de diferentes raças, gêneros e nacionalidades, como forma de endossar pautas culturais e sociais. Demonstrar preocupação com o meio ambiente também ganhou importância, com gestos como repetir roupas, por muito tempo um tabu, passando a ser vistos como sinal de consciência e estilo.

Celebridade posa em vestido branco longo em um evento sobre o red carpet, cercada por fotógrafos.
Foto: Taylor Russell (Reprodução/Instagram)

A sustentabilidade, somada à vontade de usar algo único e mais inusitado e à limitação do número de samples por peça, também impulsionou o mercado vintage, com peças de arquivo ora garimpadas por stylists, ora cedidas pelos próprios acervos das maisons, agora indispensáveis nos looks eleitos para grandes eventos.

Vestido branco de rendas com laço preto em evento de gala, lembrando elegância do red carpet.
Foto: Elle Fanning (Reprodução/Instagram)

O resgate de peças históricas mostra o impacto do passado, mas o futuro também está sendo moldado pelo peso do tapete vermelho na moda. A influência agora afeta até como uma coleção, ou nova visão criativa, é apresentada. Debutar coleções diretamente em premiações promete se tornar cada vez mais comum. Foi o caso da Givenchy de Sarah Burton, que apareceu em Timothée Chalamet e Elle Fanning no Oscar antes mesmo de surgir na passarela.

Pessoa em traje branco posando em evento com fotógrafos e flores ao fundo, remetendo a atmosfera de red carpet.
Foto: Zendaya (Getty Images)

O look perfeito no red carpet é vitrine, sim. Mas também é estratégia de guerra e negócio bilionário que dura muito mais do que o clique. Cada momento que viraliza pode lançar uma carreira, ditar tendências e gerar milhões. Em views ou vendas, tanto faz. A diferença é só o tempo de carregamento.