Moda e Skate: muito além de apenas roupas para os skatistas

por Izabela Suzuki

O universo da moda busca seu espaço entre os skatistas porque eles são uma comunidade cool. A atitude descontraída, presente nesse cenário, é inquestionável. O skateboarding emergiu como um movimento cultural nos Estados Unidos na década de 1950, mas foi na década de 1970 que ele ganhou uma nova perspectiva. O esporte tem evoluído de década em década, assim como suas roupas, e a atenção das grandes marcas em relação a elas também.

Discutir a relação entre moda e skate é um pouco mais desafiador do que falar sobre outras relações, como a do futebol e do basquete. Afinal, essa atenção mainstream nem sempre é desejada por todos que fazem parte do cenário do skate. Se ao longo dos anos, quase ninguém, exceto as marcas que nasceram do skate, quis apostar suas fichas, por que agora seria diferente? No nosso quinto episódio sobre a relação entre esportes e moda, vou contar um pouco mais sobre esse encontro amado por alguns e nem tanto por outros.

Rayssa Leal - conjunto de minissaia e jaqueta de manga longa estampados - Moda e Skate - inverno - menina negra em pé segurando uma bolsa em frente a uma parede laranja com o símbolo da Louis Vuitton - https://stealthelook.com.br
Foto: Rayssa Leal (Reprodução/Instagram)


Pegue como exemplo a Louis Vuitton, que sempre parece estar à frente de seu tempo quando o assunto são colaborações de alto luxo com o mundo esportivo. Na última terça-feira (05/03), a skatista Rayssa Leal, de 16 anos, um dos fenômenos do esporte, foi anunciada como embaixadora global da grife. Curiosamente, ela se tornou a primeira brasileira da história a ocupar tal posição. Aos 11, a "Fadinha" se consagrou como a skatista mais jovem a vencer uma final feminina do Street League Skateboarding World Tour; em 2021, também foi vice-campeã nas Olimpíadas de Tóquio.

Todo esse desempenho não apenas a destacou na modalidade, mas também a coloca como uma enorme fonte de inspiração para novas atletas que desejam um espaço em um universo que ainda é majoritariamente dominado por homens. Rayssa Leal continua quebrando barreiras e agora também abre caminho para mais uma vertente no esporte, a moda.

E esta não é a primeira vez que ela causa um impacto tão significativo na moda. Durante as Olimpíadas, tanto ela quanto as outras meninas do skate exerceram uma grande influência na busca por itens como o SB Dunk, da Nike, que teve uma procura de 850% a mais ano a ano em 2021, além das calças cargo, que eram praticamente um uniforme da modalidade e, de repente, estavam de volta aos holofotes do street style.

Apesar do skate sempre ter estado presente como parte de uma determinada comunidade e no centro das atenções, sua estreia como modalidade esportiva em Tóquio também atraiu a atenção de novos entusiastas, conectando-o a uma nova comunidade mainstream.

Briana King - shorts preto, blusa preta de manga longa e tênis rosa - Moda e Skate - verão - mulher negra de tranças andando de skate - https://stealthelook.com.br
Foto: Briana King (Reprodução/Instagram)

Para a skatista profissional Briana King, dos Estados Unidos, muitas mulheres e pessoas da comunidade LGBTQIA+ começaram a praticar skate mais tarde em suas vidas, o que significa que muitas delas já haviam desenvolvido seu estilo pessoal fora das pistas. No entanto, elas agora têm a oportunidade de incorporar esse estilo pessoal ao esporte, adicionando um toque mais fashionista. Em uma entrevista para a Vogue Business, ela observa que essa dinâmica é diferente para os homens. "Os homens agora se sentem mais confortáveis vestindo-se para andar de skate, embora muitos deles provavelmente não admitam isso".

Além disso, em duas ocasiões, a casa Dior já a vestiu. Uma vez para visitar o pop-up de uma das lojas em Montecito, na Califórnia, e outra para a inauguração da exposição "Dior: Designer of Dreams" no Brooklyn, em Nova Iorque.

Gucci x Palace - roupas diversas - Moda e Skate - verão - Três homens posando para uma foto em um campo aberto  - https://stealthelook.com.br
Foto: Collab Palace x Gucci (Reprodução/Instagram)

Ainda sobre grifes, mas agora do ponto de vista de uma marca de skateboarding, a Palace, fundada em 2009 por Lev Tanju e Gareth Skewis, tem feito movimentos incríveis no universo do esporte e da moda. Eles permanecem firmemente enraizados no skate, mas conseguem explorar outros aspectos mais fashionistas e ousados. Por exemplo, colaborações com marcas como Gucci, Y-3 de Yohji Yamamoto e até mesmo com parceiros da comunidade skatista, como a Vans.

Toda essa movimentação os levou a patamares inimagináveis, consagrando a marca como uma das mais desejadas e descoladas do streetwear. E honestamente? Se você der uma olhada no perfil deles, verá que não é difícil entender como isso aconteceu. As jaquetas bomber, camisas estampadas e colaborações são de deixar qualquer um de queixo caído, seja você um aficionado pelo esporte do skate ou não.

E se você não veste Palace, certamente quer trabalhar com ela - os dados não mentem. Até mesmo a Fórmula 1 já se envolveu nesse encontro. Para os fundadores, "muitas marcas são arrogantes, mas queremos que qualquer pessoa possa usar nossas coisas, na pista de skate ou fora dela", compartilhou Tanju com a GQ Magazine.

A necessidade por uma marca não norte-americana surgiu quando ambos os skatistas, em sua juventude, estavam cansados de ter que usar roupas das grandes marcas dos Estados Unidos e, mesmo assim, não conseguirem patrocínio para os britânicos. A marca explodiu rapidamente e permanece sendo propriedade de Skewis e Tanju até hoje, os quais não têm o menor interesse em vender a empresa para os "engravatados".

Por ser uma comunidade diversa, ao contrário do Golfe, do Tênis e da Fórmula 1, é compreensível o receio que algumas marcas e skatistas têm ao criar parcerias e colaborações. Os "engravatados", ou "homens de terno", segundo os criadores da Palace, têm uma abordagem diferente quando se trata de negócios.

Para eles, é mais fácil trabalhar com aqueles que realmente entendem seu universo, e não apenas buscam criar algo sem um propósito genuíno por trás, sem uma conexão real com o skate. Portanto, mesmo com o aumento das colaborações entre marcas de luxo e esportes (que cresceu 200% em 2020), manter o verdadeiro propósito do esporte por trás das roupas, acessórios e calçados ainda é, para os skatistas, uma forma de conexão e expressão do amor pelo skate.

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Foto: O street style é sempre o maior palco do streetwear, a moda nasce lá! (Reprodução/Phil Oh/Acielle Du Mond)

Afinal, os skatistas costumavam ser vistos como desajustados, desarrumados, desleixados e sem o mínimo de senso crítico de estilo - isso sob o olhar de quem acredita ser fácil e conveniente definir "estilo" de acordo com sua própria bolha e realidade social. Mas isso pouco importava, o legal era não se importar. Por exemplo, aqueles que viam a lenda Tony Hawk com suas manobras e suas roupas casuais, na maioria das vezes compostas por bermudas e camisetas surradas, certamente nunca o imaginariam usando Dior - o que, de fato, aconteceu.

Portanto, o que antes não era atraente para o público fora da comunidade do skate agora se tornou uma oportunidade para que mais marcas explorem, com consciência, esse universo que pode ser muito interessante e fashionista. Basta observar o estilo urbano dos últimos anos daqueles que são dedicados ao skate tanto atualmente, como antigamente. 

É verdade, falar sobre moda e skate sem mencionar Dylan Rieder, que infelizmente faleceu devido a uma batalha contra a leucemia em 2016, ou Blondey McCoy é praticamente impossível. Ambos desempenharam papéis significativos na construção dessa parceria. Rieder era conhecido por seu estilo icônico, usando jeans justos e regatas brancas, enquanto McCoy se destacava por suas escolhas fashionistas e ousadas. 

entre décadas

Os Z-Boys, originários de Venice, Califórnia, também desempenharam um papel crucial na definição do que conhecemos sobre moda e skate nos dias de hoje. Durante os anos 70, considerada a era de ouro desse encontro por muitos portais e fãs, a equipe trouxe um grande elemento de "cool" para as pistas. Com seus cabelos longos, jeans rasgados e camisas de hóquei, adicionaram ainda mais interesse e estilo ao cenário do skate.

Skatistas durante a década de 80 - roupas diversas - Moda e Skate - verão - pessoas reunidas em uma praça sentadas e andando de skate - https://stealthelook.com.br
Foto: Skatistas durante a década de 80 (Reprodução/Jenkem Magazine)

A partir dos anos 80, a Converse ganhou uma visibilidade enorme entre os patinadores. Era praticamente impossível ver um skatista sem um par de tênis de cano alto da marca. A Vans, que já era bastante popular entre eles, também lançou no mercado outros modelos que se tornaram grandes favoritos até os dias de hoje.

A cultura punk, com seus cabelos espetados, também se tornou parte integrante. Durante os anos 90, o grunge, com suas tradicionais camisas de flanela xadrez, entrou em cena. Já nos anos 2000, a ascensão do estilo hip-hop se uniu à cultura do skate. Moletons com capuz, calças largas (incluindo as cargo) dominavam o cenário, assim como bonés com logos e camisetas estampadas. Depois disso, a escala global aumentou. A Thrasher, uma revista e merca popular entre os skatistas, tornou-se uma febre, tal como a Palace. Rihanna até mesmo já foi vista desfilando uma camiseta deles.

Depois de concluir minhas últimas pesquisas para esta pauta, me deparei com uma citação do autor no início do artigo que encapsula de maneira certeira a realidade dessa intersecção. Além disso, o autor encerrou sua exposição na Culted com outra frase que, a meu ver, esclarece muito bem por que tantas grifes estão atentas a essa conexão. O diretor criativo da Noah, Brendon Babenzien, expressou isso de forma sucinta: "Os skatistas são incríveis, inteligentes e criativos, e as pessoas querem um pedaço do que eles têm. É simples assim." Essa declaração ressalta o apelo autêntico e aspiracional que o universo do skate possui, tornando-o uma fonte de inspiração e desejo para muitos na indústria da moda que até hoje estão em busca do fator "too cool to care", que muitos tentam e pouquíssimos alcançam.

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