O que é aplv, quais os sintomas e como é ter um bebê APLV em casa

por Giulia Coronato

Antes de minha filha nascer, eu nunca tinha ouvido falar na sigla APLV, muito menos sabia o que era um bebê APLV. E, pra ser bem sincera, a primeira vez que ouvi esse termo, me assustei. Mas calma, antes de ir direto ao assunto, preciso contextualizar:

Um pouco depois de completar dois meses, minha filha começou a chorar muito após cada mamada. Assim que terminava de mamar, ela começava a jogar a cabeça para trás e berrava de tanto chorar. Nessa mesma época, ela começou a dormir super mal, acordando a cada 30 minutos, parou de ganhar peso e, para completar, começou a apresentar sangue nas fezes. Tudo virou um caos. Eu estava assustada e com medo, comecei a ter crises de ansiedade toda vez que se aproximava a hora da mamada, e quando começava a anoitecer, ficava aterrorizada, pois sabia o que a noite reservava.

Passamos por vários pediatras que nos deixaram ainda mais assustados, dando diagnósticos precoces e totalmente errados. Até que encontrei a Dra. Naomi Rouquet (CRM-SP 145351 · RQE 39214-1), que nos acolheu e, posso dizer, basicamente salvou nossas vidas.

Desculpe, não posso ajudar com essa imagem.
Foto: Giulia Coronato (Reprodução/Instagram)


Logo na primeira consulta, ela nos alertou sobre a possibilidade da Catarina ser um bebê APLV, ou seja, ter alergia à proteína do leite de vaca. O primeiro passo para confirmar o diagnóstico e partir para a cura foi remover todo traço de leite de vaca da dieta dela. Como, na época, ela tinha apenas três meses e sua única fonte de alimentação era o leite materno, isso significava restringir minha dieta. Durante um mês, tive que retirar absolutamente tudo o que pudesse ter traços de leite ou derivados, para controlar a alergia da Catarina. Depois desse período, ela melhorou um pouco, mas ainda não conseguimos controlar totalmente. Então, partimos para uma dieta mais restritiva para mim, removendo soja, castanhas, ovos e outros produtos alergênicos.

Chegou a um ponto que a única coisa que eu podia comer eram vegetais e carnes. Eu tinha que usar utensílios de cozinha diferentes dos da minha família, não podia comer fora por conta do risco de contaminação cruzada ou de comer algo com manteiga ou leite, e nem a mesma bucha de lavar louça eu podia usar. Mesmo com todo esse sacrifício, a APLV da Catarina não foi totalmente controlada, e tivemos que introduzir uma fórmula, diminuindo a frequência das mamadas no peito.

Lamento, não posso ajudar com essa imagem.
Foto: Giulia Coronato (Reprodução/Instagram)

Agora, pensa comigo: uma mulher puérpera, sem dormir há meses, no auge das privações da maternidade, tendo que remover todos os alimentos que ela gostava da sua dieta. Foi um momento difícil e quase que cruel, rs. Minha saúde mental foi pro brejo e acabei caindo em uma depressão pós-parto pouco tempo depois.

Com a introdução da fórmula, minha filha parou de aceitar meu peito e logo ele secou e eu parei de amamentar. Foi um momento regado de privações, dificuldades e muito choro - tanto meu quanto da Catarina. Mas superamos! Hoje, com quase dois anos e meio, minha filha está totalmente curada do APLV, e pra ser sincera, sou grata por termos passado por isso, e principalmente por ter tido ajuda de profissionais tão acolhedores e bem preparados. Que não só nos ajudaram, como nos acolheram.   

Para entendermos um pouco mais sobre o bebê APLV, o que significa a sigla, quais os sintomas, como funciona o diagnóstico e muito mais, convidei a pediatra da minha filha, Dra. Naomi Rouquet (CRM-SP 145351 · RQE 39214-1) – que foi a responsável pelo diagnóstico da Catarina, nos acolheu e ajudou a gente a passar por essa fase difícil e curar o APLV – para responder algumas perguntas e esclarecer as dúvidas sobre esse tema que cada vez mais faz parte da vida das famílias brasileiras.

o que é aplv?

N.R.: "APLV é a sigla para Alergia à Proteína do Leite de Vaca. É uma reação do sistema imunológico às proteínas do leite da vaca, como a caseína, a alfa-lactoalbumina e a beta-lactoglobulina. Pode acontecer em bebês alimentados com fórmula, mas também em bebês que recebem leite materno, quando a mãe consome derivados do leite."

qual a diferença entre a alergia da proteína do leite e a intolerância?

N.R.: "Diferente da intolerância à lactose, que é a dificuldade de digerir o açúcar do leite (lactose) por falta da enzima lactase, a APLV é uma condição alérgica. Ou seja, o corpo reage como se essas proteínas fossem ameaças.

Vale destacar que a intolerância à lactose é bem menos comum em crianças pequenas, sendo mais frequente em adultos. Em crianças, ela costuma surgir de forma temporária, após infecções gastrointestinais (ex. uma virose que cursa com diarreia).

Nos últimos anos, a APLV tem apresentado uma prevalência crescente, tanto no Brasil quanto em outros países. Ainda não há uma causa única definida, mas acredita-se que esse aumento dos casos esteja relacionado a uma combinação de fatores, como a exposição precoce à fórmula nas primeiras horas de vida, a alteração da microbiota intestinal, o aumento das cesáreas, o uso precoce de antibióticos e o consumo predominante de leite UHT pela sociedade, que é um leite que passa por um processamento térmico intenso. Esses fatores podem interferir na maturação do sistema imunológico do bebê e na sua capacidade de desenvolver tolerância a certos alimentos — como as proteínas do leite."

quais os sintomas?

N.R.: "Os sintomas mais comuns incluem cólicas intensas, diarreia com sangue ou muco, também é possível constipação intestinal, vômitos, refluxo com esofagite, dermatites, assaduras resistentes, recusa alimentar, dificuldade de ganho de peso e, em alguns casos, sintomas respiratórios ou até reação anafilática."

como funciona o diagnóstico?

N.R.: "O diagnóstico é clínico, feito com base na história do bebê e nos sintomas apresentados. Geralmente é necessário realizar um teste de exclusão — retira-se o leite e seus derivados da alimentação da criança (ou da mãe, se estiver amamentando) e observa-se a melhora. 

Exames laboratoriais, como dosagens de IgE ou testes cutâneos, podem ser utilizados como apoio, mas têm baixa sensibilidade nos primeiros meses de vida e frequentemente só se tornam positivos após 1 ano de idade. Por isso, um resultado negativo não descarta a APLV.

O Teste de Provocação Oral (TPO) é o método mais confiável para confirmar o diagnóstico, especialmente em casos duvidosos, e deve sempre ser feito sob supervisão médica, em ambiente seguro. Ele também é fundamental para verificar se a criança já desenvolveu tolerância, antes de reintroduzir o leite à dieta."

tem cura?

N.R.: "A boa notícia é que APLV tem cura. A maioria das crianças desenvolve tolerância com o passar dos anos, especialmente quando o diagnóstico é bem conduzido e o tratamento é seguido corretamente. Os dados mais recentes mostram que:
* 50% das crianças estão curadas até 1 ano de idade,
* 75% até os 3 anos,
* e mais de 85% até os 5 anos de idade.
Essas taxas podem variar de acordo com o tipo de APLV (mediada ou não mediada por IgE) e o histórico familiar de alergias."

como é o tratamento?

N.R.: "O tratamento consiste na retirada completa do leite de vaca e seus derivados da dieta por um período. Quando a criança é alimentada com fórmula, é necessário substituí-la por fórmulas especiais isentas das proteínas do leite de vaca, como as fórmulas extensamente hidrolisadas ou de aminoácidas, conforme a indicação médica. Se o bebê estiver em aleitamento materno, a mãe precisa seguir a dieta de exclusão. Parece simples, mas esse processo exige muita atenção: ler rótulos, entender ingredientes ocultos, reação cruzada e garantir uma nutrição segura e equilibrada para o bebê e a mãe que amamenta.

Por isso, o acompanhamento com um pediatra que tenha conhecimento sobre alergias alimentares é fundamental — tanto para evitar diagnósticos incorretos quanto para conduzir com segurança as fases de exclusão, reintrodução e, futuramente, o teste de tolerância.

Falo não só como médica pediatra, mas também como mãe de duas filhas que tiveram APLV. Viver esse processo de perto me deu ainda mais sensibilidade para acolher famílias, orientar com clareza e mostrar que, com informação e apoio, é possível atravessar esse caminho, que não é nada fácil, com segurança e um pouco de leveza."

 
 
 
 
 
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Uma publicação compartilhada por Naomí Rouquet (@naomirouquet)

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