Por que crianças e adolescentes não deveriam ter acesso à internet?

por Giulia Coronato

Eu não sei vocês, mas eu sou apaixonada por podcasts. O formato se tornou minha fonte favorita para consumir conteúdos que me interessam, notícias e muito mais. A praticidade do áudio é perfeita para se manter antenada, e recentemente me deparei com um episódio que literalmente mudou minha visão sobre redes sociais.

No podcast The Subtle Art of Not Giving a F*ck, o apresentador Mark Manson recebeu Jonathan Haidt, psicólogo social, professor e autor do best-seller A Geração Ansiosa. No episódio intitulado “As mídias sociais estão arruinando nossas vidas, ou é outra coisa?”, eles discutem o impacto das redes sociais na saúde mental de jovens e como os smartphones estão comprometendo a possibilidade de uma infância saudável.

Pra ser sincera, eu nunca tinha parado para pensar muito no tema, até porque minha filha ainda nem completou dois anos e tenho outros milhares de desafios da maternidade antes de me preocupar com a relação dela com as mídias sociais. Mas, desde que escutei as palavras de Jonathan e me aprofundei de verdade no assunto, fiquei apavorada e me tornei uma verdadeira entusiasta da proibição da internet para crianças e adolescentes. Mas por quê?

Há uma razão pela qual os principais executivos do Vale do Silício proíbem que seus filhos tenham acesso à internet até pelo menos os 14 anos. Na verdade, há uma longa lista de razões e todo mundo precisa conhecê-las, sejam pais ou não. 

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Crianças e adolescentes.
Foto: Red Bubble (Reprodução/Pinterest)


as redes sociais adoecem nossas crianças e adolescentes

Segundo o livro ‘A Geração Ansiosa’, que examinou as tendências de saúde mental em crianças e adolescentes, o aumento brusco de doenças mentais a partir de 2010 não foi meramente devido a uma maior disposição para falar sobre o assunto. É ao menos curioso ver que os casos de doenças psiquiátricas em jovens tenham aumentado tanto a partir do ano que foi lançado o Instagram, não é? Depressão, ansiedade, TDAH, bipolaridade, abuso de substâncias, anorexia e esquizofrenia, todos cresceram exponencialmente em jovens desde 2010, segundo o American College Health Association. A Geração Z foi a mais afetada, embora os Millennials não tenham sido totalmente poupados. E por que isso? A resposta é simples, a Gen Z foi a cobaia das redes sociais. E já conseguimos — depois de um pouco mais de 10 anos — ver o impacto disso. Somos a geração mais triste, ansiosa e solitária de todas.

Outro ponto preocupante foi o aumento do suicídio e da automutilação infantil. Segundo a Agência Brasil, a taxa de suicídio entre jovens cresceu 6% por ano no Brasil entre 2011 a 2022, enquanto as taxas de automutilação na faixa etária de 10 a 24 anos de idade evoluíram 29% ao ano no mesmo período. Os números apurados superam os registrados na população em geral. Embora hoje as taxas de suicídio entre adultos sejam maiores, a taxa entre adolescentes cresce mais rápido.

os smartphones estão matando a infância como conhecíamos

A infância saudável e divertida como conhecíamos está se extinguindo. Brincar ao ar livre, passar tempo com amigos, ler livros e sair com a família está acontecendo cada vez menos, para dar espaço às horas de TikTok, Instagram e Youtube. Com as crianças passando entre 3 a 7 horas diárias na frente de uma tela, muitos itens essenciais da infância são deixados de lado para diversão online.

os smartphones são tão viciantes quanto drogas

Uma nova pesquisa compartilhada pelo portal Wait Until 8th, mostra que a dependência do smartphone pode produzir algumas das mesmas respostas cerebrais viciantes semelhantes às do álcool, drogas e jogos de azar. Os celulares são como caça-níqueis no bolso dos seus filhos, persuadindo-os constantemente a desejar e interagir mais. A indústria de tecnologia projeta intencionalmente aplicativos e mídias sociais para as pessoas usarem por longos períodos de tempo, porque é assim que elas ganham dinheiro. 

Duas pessoas em um banheiro, ambas de camisa branca e jeans, uma beijando a testa da outra. Crianças e adolescentes.
Foto: @lglora (Reprodução/Instagram)

os smartphones prejudicam a vida escolar

Os anos do ensino fundamental e médio estabelecem uma base para o sucesso da vida profissional de todos nós. As crianças aprendem a administrar o tempo, os projetos e os deveres de casa. Introduzir uma distração constante com um smartphone está prejudicando o cérebro das nossas crianças e adolescentes. Um estudo sobre desenvolvimento cerebral, feito pelo Instituto Nacional de Saúde, mostra que crianças que passavam mais de duas horas por dia olhando para uma tela obtiveram notas mais baixas em testes de pensamento e linguagem. Enquanto uma outra pesquisa da Universidade do Texas, sugere que a mera presença do seu smartphone reduz a capacidade cognitiva e o poder cerebral. 

Por isso, projetos de lei que proíbem o uso de celulares nas escolas — como o que foi aprovado em São Paulo na última semana — são tão importantes e urgentes.

as redes sociais expõem crianças a conteúdos impróprios

Os smartphones permitiram que as crianças tivessem acesso à pornografia em poucos cliques. Um estudo do Centro de Pesquisas de Crimes Contra Crianças, da Univesidade de New Hampshire, mostrou que 42% de adolescentes e crianças que jogam jogos online foram expostos à pornografia. Destes, 66% relataram exposição indesejada, geralmente por meio de anúncios.  

As crianças não estão apenas visualizando conteúdo sexual impróprio com seus celulares, mas também estão criando seus próprios conteúdos. Adolescentes cada vez mais jovens estão sendo adeptos do “sexting” — enviando mensagens de tom sexuais e imagens explícitas uns aos outros. Além disso, vários aplicativos abrem portas para predadores sexuais que buscam rastrear nossas crianças, muitas vezes se passando por alguém menor de idade.

o aumento do uso de redes sociais está diretamente ligado ao desenvolvimento de transtornos alimentares

Uma pesquisa da Biblioteca Nacional de Medicina, mostra que o aumento do tempo gasto em mídias sociais é um fator de risco para transtornos alimentares. Nos últimos 10 anos, houve um aumento na taxa de indivíduos mais jovens, incluindo pré-adolescentes e crianças de 9 e 10 anos, sofrendo de transtornos como anorexia, bulimia e dismorfia corporal. E não temos como culpá-las. Se nós, adultos que já temos o cérebro completamente desenvolvido, nos pegamos nos comparando e nos sentindo mal ao ver uma foto de uma modelo da Victoria’s Secret desfilando, como você acha que uma criança vai interpretar isso? Além das fotos super editadas e filtradas, as redes sociais também oferecem aos usuários milhares de conteúdos problemáticos, como a trend ‘magras, magras, magras’, do TikTok. Assim como desafios de perda de peso, dietas extremas e não saudáveis e técnicas para perder peso rápido. 

Leia mais: Quando normalizamos distúrbios alimentares?

o que fazer?

Acredite, existem muitas outras razões pelas quais crianças e adolescentes devem estar longe das redes sociais, e eu sei que as informações são assustadoras e o medo pode dominar por aí, mas não se desespere, há diversas coisas que podemos fazer para proteger nossas crianças e adolescentes. No livro A Geração Ansiosa, Jonathan traz algumas soluções que achei válido compartilhar:

  1. Dê às crianças mais tempo para brincar ao ar livre com outras crianças;
  2. Procure comunidades offlines para seu filho, coloque-o em um esporte, uma aula de música, um clube de estudo e por aí vai;
  3. Quando seu filho começar a sair sozinho não dê a ele um smartphone e sim um celular focado em comunicação, e não para aplicativos e redes sociais;
  4. Não dê um smartphone para o seu filho até o começo do ensino médio;
  5. Adie a abertura de contas em quase todas as plataformas de redes sociais até o início do ensino médio (pelo menos).
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