Como se apaixonar em tempos de relações líquidas?
“Amor líquido é um amor até segundo aviso,
o amor a partir do padrão dos bens de consumo:
mantenha-o enquanto ele te trouxer satisfação,
e o substitua por outros que prometem ainda mais.
(...)
Na sua forma “líquida”,
o amor tenta substituir a qualidade por quantidade -
mas isso nunca pode ser feito,
como seus praticantes mais cedo ou mais tarde
acabam percebendo.”- Zygmunt Bauman
Se o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman já falava sobre "amores líquidos" em 2004, fico me perguntando o que ele diria atualmente, nesta era dos romances e diagnósticos "tiktokizados".
A verdade é que estamos mal acostumadas. Com o avanço da tecnologia, temos acesso a respostas e informações que antes pareciam impensáveis, e tudo isso em uma velocidade quase instantânea. Não me entendam mal, eu amo a tecnologia e toda a praticidade que ela nos oferece. Porém, como tudo tem seus dois lados, ela nos faz inconscientemente acreditar que tudo ao nosso redor deveria acompanhar o seu ritmo – e isso é humanamente impossível.
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Quer uma pizza? Abra um aplicativo e peça em segundos. Quer saber o que alguém está fazendo nesse exato momento? Vá nos stories e veja seus posts. Quer resposta para literalmente qualquer pergunta? Entre no ChatGPT ou chame a Alexa e tenha a resposta. Mas e o amor? Por que ele parece continuar sendo tão difícil de compreender? Talvez, porque vivemos em tempos de amores líquidos, onde tudo é volátil e passageiro.
Mesmo com diversos aplicativos de relacionamento por aí com o intuito de realizar o "match perfeito", ainda assim (e ainda bem) não conseguimos chegar à fórmula do amor ideal. E isso acontece porque estamos falando de seres humanos e, com isso, qualquer relação que nos permeiam será complexa e ambígua – assim como nós.
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Vivemos tempos de "simplificação", em que tudo deve caber em vídeos de, no máximo, 1 minuto e meio, mas que precisam te fisgar nos primeiros 3 segundos. É uma corrida incansável e insaciável por atenção, na qual nunca sabemos ao certo onde depositar nosso tempo, já que, ao rolar a tela para cima, um conteúdo novo e talvez ainda mais interessante nos espera.
Será que as relações também se tornaram assim? Será que estamos buscando por amor como buscamos um delivery na sexta à noite? Rápido, fácil, gostoso e sem louça para lavar?
Ao mesmo tempo em que o acesso à informação ficou muito mais fácil, a busca por conhecimento em si se tornou muito mais superficial. Poucas palavras, poucas trocas e poucas ações genuínas. Em tempos em que um like virou demonstração de afeto, tudo o que exige mais do que um clique parece esforço demais.
Sim, reclamei muito neste texto, mas agora vem a parte boa: ainda há salvação. Para os últimos românticos e românticas que leram tudo isso com uma pitada de dor no coração, fiquem calmos, vocês não estão sozinhos.
Pode até ser que o mundo esteja uma bagunça e os amores líquidos tornem as relações mais frágeis, mas, no fim do dia, o que sempre vai prevalecer são as nossas escolhas e aquilo que cultivamos ao nosso redor. Existem sim, e sempre existirão, pessoas que buscam os mesmos sonhos e valores que você; basta estar aberta a conhecê-las e escolher estar ao lado delas.
Não se prenda tanto aos conselhos e direcionamentos de pseudopsicólogos formados pela FAZ (Faculdade de Algoritmos Zuckerberg), sobre como identificar o par perfeito, até porque você não é. Permita-se o mistério, o acaso, a descoberta.
Me chame de antiquada, mas eu sigo sonhando com manhãs de domingo lentas, com bossa nova no rádio, um parceiro para chamar de meu fazendo ovos na cozinha, enquanto crianças correm pela sala porque o cachorro caramelo vira-lata roubou suas meias. Sim, esse é um sonho que Inteligência Artificial nenhuma vai construir, apenas eu mesma.
Se apaixone, fantasie, se iluda e se frustre – a partir dessa etapa, é que podemos começar a falar de amor. Você não precisa permanecer em lugares que não fazem sentido para você, mas não descarte o outro por não atender todas as suas expectativas; ninguém vai.
Por fim, em nome de todos os grandes poetas e filósofos que dedicaram uma vida inteira em busca de decifrar 1% do amor, lembre-se: em tempos de "touch", curta o toque.