É o fim da perfeição? Entenda a ascensão do ugly fashion em 2025

por Sofia Chel

Dizem que a beleza está nos olhos de quem vê — e eu devo concordar. Sempre me senti atraída por tudo aquilo que fugia dos padrões, justamente por ser diferente do que nos era imposto como “bonito”. Com a ascensão das redes sociais e o bombardeio constante de microtendência atrás de microtendência, em que todos parecem se vestir da mesma forma, é natural que surja um movimento que vá na contramão desse visual polido — como o proposto pelo quiet luxury ou pela estética clean girl, marcada por uma beleza impecável, sem um fio de cabelo fora do lugar.

É nesse cenário que o ugly fashion ressurge com ainda mais força, desafiando os ideais estéticos que dominaram os últimos meses e propondo uma nova forma de recuperar algo essencial: o individualismo e a autenticidade.

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o que é ugly fashion e por que ele chama tanta atenção?

Se o termo ugly fashion ainda soa um pouco desconhecido, aqui vão alguns exemplos que ajudam a formar essa imagem na sua cabeça: Crocs, tênis com salto, unhas invertidas, coletes puffer volumosos, combinações improváveis, bermudas e calças oversized, botas Tabi... São essas e outras peças que geram curiosidade e causam burburinho — nem que seja para dividir opiniões, arrancar risadas ou simplesmente provocar estranhamento.

Tênis desgastados e rasgados, exibindo design de moda inusitado e chamativo, ilustrando o conceito de
Foto: Paris Sneaker (Reprodução/Balenciaga)


E é justamente aí que mora a estratégia: o feio chama atenção. Muitas marcas usam o ugly fashion como uma forma deliberada de atrair os holofotes — e a Balenciaga domina essa arte como ninguém. A marca aposta no exagero e no desconforto estético não apenas para criar desejo, mas para garantir que estará sempre em pauta, independentemente da reação do público. Quem não se lembra do Paris Sneakers, aquele tênis propositalmente destruído, com cara de quem sobreviveu a um mundo pós-apocalíptico? Ou da Trash Pouch, literalmente um saco de lixo feito em couro brilhante, vendido por nada menos que US$ 1.800? Pois é. A intenção da Balenciaga não é agradar a todos — é provocar, gerar conversa, garantir presença nos trend topics e, principalmente, estar na boca do povo. Sempre.

Modelo usando camisa azul, minissaia bege e meias com sapatos de salto. Estilo ousado e vanguardista.
Foto: Miu Miu Primavera/Verão 2022 (Reprodução/Vogue Runway)

ugly chic da miu miu

Já a Miu Miu é mestre no ugly chic — uma versão mais refinada do feio, onde tudo o que a marca lança acaba viralizando e redefinindo o que entendemos como “bom gosto”. Desde o início, a marca-irmã mais jovem da Prada veio com a proposta de abraçar o lado excêntrico da feminilidade, com coleções que remetem ao vintage, apostam em cortes inusitados e combinações improváveis. Há sempre um certo ar de “menina má inteligente” em suas criações — um flerte com o kitsch, o desconforto e o inesperado. E é exatamente por isso que ela se tornou referência no que hoje chamamos de ugly chic.

Essa assinatura estética, construída ao longo dos anos, encontrou terreno fértil no zeitgeist atual — um momento em que o estranho, o deslocado e o imperfeito passaram a ser celebrados como símbolos de estilo. A marca começou a se consolidar entre fashionistas por volta de 2010, mas foi nos últimos anos, especialmente no pós-2020, que a Miu Miu reposicionou o “estranho” como o novo luxo. Um exemplo claro disso é a coleção Primavera/Verão 2022, com suas micro saias de cós baixo, suéteres recortados e alfaiataria imperfeita, que rapidamente dominaram as redes sociais, as capas de revista e o street style das semanas de moda.

Modelo usa óculos de aro grosso em desfile, destacando tendência de moda inusitada.
Foto: Miu Miu Outono/Inverno 2024 (Reprodução/Vogue Runway)

E os óculos de grau ovais, então? Um item antes nada quase associado ao glamour rompeu a bolha do mainstream e virou símbolo de estilo. Desde quando usar óculos de grau se tornou tão cool? Podemos — e devemos — agradecer a Miuccia Prada por isso. E se você, como eu, tem problema de visão, vai entender o valor de ter finalmente um par de lentes que também carrega atitude.

o fascínio pelo feio não é apenas visual

O fascínio pelo feio vai muito além do aspecto visual — ele também pode ser emocional, quase instintivo. E, para provar que isso não se limita à moda, trago um exemplo pessoal: a minha obsessão pelas canecas de pirata da minha tia. Elas são monstruosas, com feições esculpidas que beiram o grotesco — cabeças enrugadas, olhos esbugalhados, expressões nada simpáticas. Ainda assim, ocupam lugar de destaque na estante de livros da casa dela.

Mesmo que diga que não gosta, eu sempre soube que, no fundo, há um certo carinho. Elas são tão feias, que acabam ficando bonitas. Quanto mais as visitas torcem o nariz para aquelas canecas, mais cresce o nosso apego por elas.

E eu, claro, sigo sonhando com o dia em que uma delas vai morar em algum cantinho especial da minha própria casa. Porque, no fim das contas, essa é a verdadeira graça dos bibelôs: aqueles que são únicos, imperfeitos e cheios de história.

Foto: Jessi Regina (Reprodução/Instagram)

o que podemos concluir...

Talvez seja por isso que o feio tenha ganhado tanta força em tempos de tendências cada vez mais iguais e rasas — quando todo mundo parece saído do mesmo feed, vestir o que foge do algoritmo é quase um ato de resistência. É preciso ter habilidade para fazer peças tão “erradas” se tornarem tão boas — e isso faz parte do apelo do ugly fashion.

Não é à toa que a teoria do sapato errado é tão forte — qualquer um pode vestir um vestido bonito, mas é quem enxerga charme no inesperado, graça no que parece errado, beleza no que muitos descartam, que realmente entende o espírito desse movimento. O ugly fashion tem esse poder: ele não busca aprovação imediata — ele propõe um novo olhar. Um olhar que escolhe ver o interessante onde outros só veem o estranho.

Talvez o feio seja, no fim das contas, uma maneira de contar quem somos — com todas as nossas falhas, exageros, ruídos e camadas. E é justamente isso que o torna tão especial: ele provoca, desconcerta e se destaca.

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